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Artigo

  • Movimentos Sociais realizam seminário sobre o momento político

    No início de abril, aconteceu em Brasília um Seminário Nacional da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político para avançar na discussão sobre a democratização do poder e da efetivação da Reforma do Sistema Político. Participaram cerca de cem pessoas de diversas lutas, de muitas regiões do país.

    Segue artigo de Marcel Farah publicado pelo site da Plataforma http://www.reformapolitica.org.br
    07.04. 2019, onde se pode ver fotos, vídeo e outros artigos.

     O fim da nossa democracia?

    Por Marcel Farah

    Ocorreu em Brasília, nos dias 2 e 3 de abril, o seminário nacional da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político. A reforma política, há algum tempo (mais de dez anos), motiva estas organizações sociais a pensarem e agirem no sentido de potencializar a democracia brasileira.

    O seminário contou com uma diversidade enorme de organizações, com agendas variadas, desde acadêmicos que estudam a democracia, passando por movimentos de combate à corrupção, até entidades de defesa de direitos das mulheres, das populações LGBTI, de populações de negros e negras, de juventude, de comunidades tradicionais e povos de terreiros. Um dos pontos centrais, portanto, foi o baixo nível de representatividade dos poderes Legislativos e Executivos, além do Judiciário e do próprio poder da mídia de massas.

    O tom dos debates da Plataforma, como é conhecido este movimento, é que o sistema político vai muito além das eleições, pois relaciona-se com a forma como o poder está distribuído em nossa sociedade. Por exemplo, como as decisões políticas são tomadas.

    Sobre o debate em si, há três questões de alta importância social e democrática, advindas do momento da vida nacional em que estamos. As ameaças à democracia brasileira, as ameaças aos direitos das gerações, digo a idosos e idosas, e a ameaça militar.

    Ameaças à democracia

    A eleição de um governo saudosista da ditadura militar, do autoritarismo, que nega a estrutura racista, machista e homofóbica de nossa sociedade é uma contradição, senão um sinal de mal funcionamento da democracia brasileira. Neste sentido, é preocupante a legitimação institucional das eleições de 2018 sem ressalvas, mesmo com as suspeitas de caixa 2 para difusão de mentiras via redes sociais.

    No mesmo sentido, é comprometedora, para as instituições, principalmente judiciárias, a proibição da candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva, preso sob duvidosos argumentos jurídicos, em 2018.

    Sobre o tema, inclusive, nos aproximamos de julgamento do STF, agendado para 10 de abril, que decidirá se é constitucional ou não prender uma pessoa antes do julgamento definitivo.

    Segundo a Constituição não é permitido prender ninguém, a não ser cautelarmente, até o trânsito em julgado, quando não há mais recursos. A questão tem implicação direta no caso do ex-presidente, mas não se refere ao caso em específico. O que se decidirá é se está mantida a presunção de inocência ou se alteraremos a Constituição de nosso Estado.

    O problema é que, para alterar a Constituição de nosso Estado, é preciso que atue o Poder Legislativo e, no caso, como se trata de “cláusula pétrea”, somente uma nova Constituição poderia fazê-lo.

    Conclusão: vivenciamos rupturas na democracia chanceladas pelas instituições.

    Ameaça aos direitos geracionais

    Sob o argumento de que é preciso reduzir um suposto déficit para liberar dinheiro do orçamento público, idosos e idosas têm seus direitos ameaçados com a proposta de reforma da Previdência. Contudo, fica cada dia mais nítido que a proposta de reforma não busca combater privilégios, mas apenas fazer caixa para o orçamento.

    A justificativa é de que a redução dos gastos com Previdência permitiria ao país voltar a crescer. Mas, retirar dinheiro da Previdência sem combater privilégios, ou seja, penalizando os que usam toda sua aposentadoria para sobreviver, é retirar dinheiro da economia.

    Aposentados que recebem até dois salários mínimos, que são 82% do regime geral de Previdência, gastam seu salário no consumo. Consumo faz a economia girar, gerando emprego e renda. Retirar este dinheiro vai contrair a economia. Por outro lado, o governo não diz, e acho que nem sabe, onde utilizaria esta suposta economia caso não fosse para a Previdência.

    Na CCJ da Câmara, o ministro da Economia chegou a dizer que se gasta muito mais com Previdência do que com saúde ou educação. Entretanto, para muitos, a Previdência é saúde, pois permite a compra de medicamentos, e educação, paga mensalidades, alimentação, transporte, todos gastos necessários para que as famílias mantenham seus filhos e filhas bem nas escolas.

    Outra vez é a Constituição que está sob ameaça, pois é lá que estão garantidos os direitos previdenciários.

    Ameaça militar

    Por fim, outro problema, tão relevante quanto os demais, é a numerosa participação militar no atual governo federal. As forças militares são uma incógnita para a sociedade em geral, apesar de serem vistas com bons olhos, as experiências históricas demonstram o contrário. Adicionalmente, para o governo federal, a democracia seria uma concessão dessas forças.

    Neste ponto, o grande desafio é inverter esta equação, mostrando que, em uma democracia, as forças militares existem desde que em respeito às regras do jogo, ou seja, elas é que são uma concessão da democracia. Afinal de contas, quem garante que não atuarão enquanto militares se sucumbirem enquanto políticos?

    Novamente, uma ameaça à Constituição de 1988.

    É imprescindível, portanto, o debate feito pela Plataforma, no sentido de que a democracia como foi constituída em 1988 encontra-se sob ameaça, logo, a luta pela reforma do sistema político está na ordem do dia e representa a resistência democrática e popular.

    Marcel Farah é Educador Popular

  • Carta à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

    Carta à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

    A sociedade civil organizada e movimentos sociais, por meio da Frente Parlamentar Mista  em Defesa da Democracia e Direitos Humanos com Participação Popular, movidos pelo ímpeto de defesa dos direitos fundamentais, sobretudo das populações mais vulneráveis, vêm, à CNBB, apresentar suas preocupações quanto aos Projetos de Lei n. 881/2019 e 882/2019 em tramitação na Câmara dos Deputados, bem como quanto aos Projetos de Lei do Senado n. 1.864/2019 e 1.865/2019, popularmente denominados “Pacote Moro” e/ou “pacote anti-crime” e solicitar o engajamento da CNBB.

    O “pacote anti-crime”, apresentado pelo Ministério da Justiça ao Congresso Nacional, contém apresenta de alterações ao Código de Processo Penal, Código Penal, Lei de Execução Penal e se propõe a enfrentar a corrupção e o crime organizado, a partir do recrudescimento penal e da relativização dos direitos e garantias individuais.

    Os projetos estão com tramitação avançada: na Câmara dos Deputados foi composto um Grupo de Trabalho para conduzir audiências públicas e analisar as propostas e, no Senado Federal, já possuem relatores designados e, a princípio, tramitarão somente pela Comissão de Constituição e Justiça (em apreciação terminativa), sem qualquer discussão aprofundada.

    As fórmulas primordialmente baseadas recrudescimento penal estão sendo experimentadas há anos pela sociedade brasileira e têm se mostrado ineficazes e, na prática, ensejado o aprofundamento da insegurança pública e da violência contra a população periférica, incluindo o encarceramento em massa.

    A ampliação das excludentes de ilicitude para policiais, um dos itens de destaque da proposta em comento, vai de encontro à necessidade de adoção de medidas voltadas à diminuição da morte de civis por agentes de segurança pública, com atenção à evidente seletividade no que toca ao exercício da violência letal por parte desses agentes. Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e do Núcleo de Estudos da Violência da USP mostram que, em 2017, apenas no Estado de São Paulo, 19,5% das mortes violentas foram provocadas por policiais, sendo que três quartos desse contingente é composto por jovens negros. Tal número, no entanto, é inferior ao real e de difícil aferição em escala nacional, dada a subnotificação, especialmente nos casos envolvendo a associação de agentes de segurança pública e grupos de extermínio ou milícias.

    A inclusão do “medo, surpresa e violenta emoção” como possíveis causa de redução ou isenção de pena, ampliam a discricionariedade do judiciário e podem contribuir para a ampliação da violência contra a mulher – retomando a tese da legítima defesa da honra, por exemplo. Em 2016, 4.645 mulheres foram assassinadas no Brasil, o que representa uma taxa de 4,5 homicídios para cada 100 mil brasileiras e uma média de 13 mulheres assassinadas por dia no país. Os dados são do Atlas da Violência 2018, que aponta ainda que, em dez anos, entre 2006 e 2016, observou-se um aumento de 6,4% na taxa de homicídios de mulheres. A taxa de homicídios é maior entre as mulheres negras (5,3%) do que entre as não negras (3,1%) — uma diferença de 71%.

    Diante ainda desse quadro, a adoção de medidas de estímulo à posse e porte de armas de fogo, responsáveis por mais de 70% das mortes violentas no país, merece também especial destaque. Há o risco de aumento dos feminicídios também pela ampliação da posse de armas, dado o fato de que a maioria desses delitos ocorre em ambiente doméstico, além da precarização da atividade de segurança pública, a partir dos riscos que a política de confronto traz à vida dos policiais.

    Vale destacar ainda a inadequação da adoção de mecanismos negociais como solução para a ineficiência e morosidade do sistema de justiça criminal brasileiro. A proposta viola a garantia constitucional do devido processo legal e ignora a ausência de efetivo controle sobre a atividade do Ministério Público. Importar o mecanismo de acordos penais, previstos em legislações estrangeiras, desconsiderando as diferenças entre os sistemas jurídicos dos países, agravará o superencarceramento.

    Outro problema da proposta apresentada pelo Ministério da Justiça está na inconstitucionalidade da execução antecipada da pena, após a condenação em segunda instância ou mesmo em primeiro grau, no caso do procedimento do júri. Diante do número considerável de provimento de recursos pelos Tribunais Superiores, a execução antecipada é um caminho aberto para o aumento de casos de erros do judiciário.

    O aumento dos lapsos para progressão de regime – e a vedação da progressão em alguns casos – viola o princípio constitucional da individualização das penas e ignora o crescimento exponencial das taxas de aprisionamento no Brasil, especialmente por crimes menos graves. A proposta contraria o entendimento do Supremo Tribunal Federal, que valoriza o sistema progressivo de penas (Súmula Vinculante 26 e HC 82.959). A vedação da liberdade provisória e progressão de regime a pessoas com conduta criminosa considerada “reiterada ou habitual”, poderá ter impacto significativo no encarceramento de acusados da prática de delitos leves, como mulheres em situação de vulnerabilidade social e usuários de drogas.

    As medidas de endurecimento da execução das penas, como os modelos de segurança máxima ou os que implicam em isolamento, restrição de visitas e monitoramento indiscriminado de conversas (com advogados, familiares, representantes religiosos, etc), bem como a obstrução de saídas temporárias, também objeto dos projetos de lei, violam direitos e garantias constitucionais, incluindo de familiares, tendo se mostrado problemáticas e inefetivas nos países em que foram empregadas.

    O “pacote anti-crime” foi elaborado sem qualquer participação ou consulta à sociedade civil e a integrantes do sistema de justiça, carecendo de efetiva construção democrática, de embasamento teórico e de análise de impacto social e econômico.

    Não olvidamos que a violência é uma realidade que hoje assola o país, contudo temos claro que as estratégias para o enfrentamento devem ser consistentes e embasadas em pesquisas empíricas, observando os direitos e garantias fundamentais inscritos na Constituição Federal e nos tratados internacionais de Direitos Humanos.

    A complexidade e magnitude dos problemas em questão requerem a construção de respostas sistêmicas e sofisticadas, que passam pela implementação de direitos sociais, pela discussão das competências federativas e reclamam um amplo planejamento e uma reorganização estrutural da governança, gestão e controle social dos órgãos de segurança pública, do sistema prisional e do sistema de justiça criminal.

    A insistência em soluções calcadas na ampliação do encarceramento revela despreocupação com o estado de coisas inconstitucional no sistema penitenciário nacional, cuja superlotação tem servido menos à redução da violência e mais ao recrutamento de pessoas em situação de vulnerabilidade pelas facções que se pretendem ver desarticuladas.

    Desta feita, as entidades e Parlamentares aqui presentes, por meio da Frente Parlamentar Mista com Participação Popular em Defesa da Democracia e Direitos Humanos, conclamam, por fim, a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil a se unirem a nós na luta em defesa aos direitos fundamentais, os quais encontram-se vilmente ameaçados por tais projetos de lei que, repisa-se, não devem prosperar.

    Brasília, 03 de abril de 2019.

    Frente Parlamentar Mista em Defesa da Democracia e Direitos Humanos com Participação Popular

  • Inventário da violência da ditadura cívico-militar-empresarial a partir de 1964

     

    Inventário da violência

    Do Prof. Dr. Fernando Altmeyer da PUC-SP  já foram publicadas várias matérias de cunho histórico e estatístico. É conhecido por sua seriedade. Desta vez, é importante que leiamos o que recolheu de maldades e barbaridades que a ditadura civil-militar-empresarial produziu em 21 anos de sua vigência.  Consciência da verdade, da justiça e sobretudo da memória de dor exigem/clamam que enfrentemos a vontade diabólica do atual presidente  que pretende celebrar o golpe após 55 ano de uma sangrenta ditadura  imposta em 31 de março de 1964.

    Seria como se Angela Merkel obrigasse celebrar a figura de Adolf Hitler e Putin a figura de Stalin, com os horrores que ambos e outros cometeram contra a humanidade e a dignidade humana. Desta forma somos, como cidadãos, degradados por um Presidente que deveria, por ofício, representar valores humanitárias e democráticos e respeitosos das vítimas, de ambos os lados,  pois houve excessos de ambas as partes, dos que reprimiam e dos que eram reprimidos. Ocorre que a violência repressiva  provinha  dos agentes do Estado de exceção que, por dever, como Estado, deve proteger  o cidadão e não persegui-lo, torturá-lo, fazê-lo desaparecer e finalmente assassiná-lo.

    Brasil Nunca Mais
     é o livro publicado pelo Card.Paulo Evaristo Arns de São Paulo.  A singularidade deste livro que o torna insuspeito reside no fato de que foi escrito estritamente a partir de documentos produzidos pelas próprias autoridades encarregadas da repressão. Não vinham das vítimas das torturas mas dos produtores das torturas em nome do Estado de Segurança Nacional em processos do Superior Tribunal Militar (STM), num total que ultrapassa um milhão de páginas de mais de 707 processos completos e de outros incompletos.

    Dai a importância deste breve inventário dos horrores que a ditadura impôs ao povo brasileiro produzido acuradamente pelo Prof. Fernando Altmeyer Jr. Ele vem comemorado pela paranóia do atual presidente que não reconhece o fato da ditadura e que disse e repetiu:”a ditadura cometeu um erro: torturou quando devia ter fuzilado os subversivos”.  Aí não temos mais palavras. A ignomínia é demasiadamente grande para ser pensada e refutada.

    Brasil, Nunca Mais (1985 pela Editora Vozes) foi o título do livro que o Cardeal Arns apresentou em nome da Igreja diante do mundo inteiro os horrores das salas de tortura mas no sentido da paz e para que nuca mais se repita esta tragédia e se supere a banalidade do mal. Lboff

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    Inventário da violência praticada durante a ditadura cívico-militar-empresarial desde 1.4.1964: 55 anos de dor, amnésia, injustiça e sofrimentos de todo o povo brasileiro:

    500.000 cidadãos investigados pelos órgãos de segurança
    200.000 detidos por suspeita de subversão
    50.000 presos entre março e agosto de 1964
    11.000 acusados em julgamentos viciados de auditorias militares
    5.000 condenados
    10.000 torturados no DOI-CODI de São Paulo
    40 crianças presas e torturadas no DOI-CODI paulistano
    8.300 vítimas indígenas de dezenas de etnias e nações
    1.196 vítimas entre os camponeses
    6.000 mil apelações ao STM que manteve as condenações destes 2.000 casos
    10.000 brasileiros exilados
    4.882 mandatos cassados
    1.148 funcionários públicos aposentados ou demitidos
    1.312 militares reformados compulsoriamente
    1.202 sindicatos sob intervenção do Estado e do Judiciário cúmplice e inconstitucional
    248 estudantes expulsos de universidades pelo famigerado decreto ditatorial numero 477
    128 brasileiros e 2 estrangeiros banidos sendo alguns sacerdotes católicos …
    4 condenados à morte (pena comutada para prisão perpetua)
    707 processos políticos instaurados pela Justiça militar em diversas Auditorias
    49 juízes expurgados, três deles do Supremo Tribunal Federal
    3 vezes em que o Congresso Nacional foi fechado pelos generais ditadores
    7 Assembleias Legislativas postas em recesso
    Censura prévia a toda a imprensa brasileira

    434 mortos pela repressão
    144 desaparecidos
    126 militares, policiais e civis mortos em ações contra a resistência à ditadura
    100 empreiteiras e bancos envolvidos em escândalos abafados pelos militares
    Reimplantação do trabalho escravo nas fazendas do Brasil com o beneplácito dos governos militares.
    Sucateamento das Universidades pela imposição do programa MEC-USAID
    Destruição do movimento social brasileiro
    Fim das organizações da sociedade civil como UNE, Centros de Cultura, Ligas Camponesas, JUC, Agrupamentos e partidos de esquerda.
    Corrupção em todos os níveis por grupos militares e cobrança de propinas para as grandes obras.
    Submissão aos interesses norte-americanos pela presença da CIA e de torturadores treinados na Escola das Américas em todos os órgãos policiais e militares.
    Destruição das Guardas municipais e estaduais e militarização das policias
    Domínio da Lei de Segurança Nacional e propaganda da Ideologia de Segurança Nacional.
    Expansão do poder de empresas beneficiarias do golpe como redes de TV, jornais pro-ditadura e grupos econômicos que financiaram a tortura e a repressão.

    21 anos de ditadura e escuridão com a destruição das vias democráticas e o vilipêndio da Constituição e da Liberdade em nome do Estado autocrático e destrutivo da nação brasileira.
    Construção de obras faraônicos como Transamazonica, Ponte rio-Niteroi, Itaipu e outras com desvio de vultosas quantias do erário publico para empresas e corruptos do governo federal e estadual.
    Instauração de senadores e prefeitos biônicos.
    Criação de locais de tortura e casas da morte, como por exemplo, a de Petrópolis-RJ.
    Instalação de campos de concentração em território nacional usando de técnicas nazistas.
    Pagamento e manutenção de imensa rede de arapongas e informantes das forças repressivas para denunciar os que lutavam pela democracia.
    Apoio de médicos para a realização da tortura e para fazer laudos falsos das mortes em prisões e locais do Estado brasileiro.
    Perseguição e morte de brasileiros fora do Brasil em ligação com as forças ditatoriais de outros países do Cone Sul.
    Acolhida de ditadores de outros países como Alfredo Stroessner do Paraguai.
    Financiamento de grupos paramilitares.
    Apoio a atos terroristas e incêndio de prédios (UNE), bancas de jornais, redações, igrejas, sindicatos, e apoio às milícias de latifundiários para extermínio sistemático e impune de índios e
    posseiros em toda a Amazônia e Nordeste brasileiro.
    Campanha de difamação contra bispos, pastores, líderes políticos em canais de televisão para indispor a opinião pública e favorecer a repressão.
    Proibição de citar o nome de Dom Helder Câmara em qualquer órgão de imprensa do Brasil por mais de 20 anos, quer notas positivas quer negativas.
    Bombas explodidas em todo o território nacional e em particular no episódio do RioCentro a mando de generais e grupos terroristas dentro das Forças Armadas.
    Perseguição aos artistas brasileiros.
    Formação da ARENA, partido de direita manipulado pelos militares e elite financeira do Brasil.
    Repressão e perseguição da UNE e invasão da PUC-SP pelo coronel Erasmo Dias.

     Fontes: relatórios da CNV, dados de Luiz Claudio Cunha e informes do
    gabinete do Deputado Adriano Diogo, da Assembleia Legislativa do
    Estado de São Paulo, dados do livro Brasil, Nunca Mais.

    26/03/2019 do site de Leonardo Boff

  • A armadilha da Reforma da Previdência

    JEFERSON MIOLA – Integrante do Instituto de Debates, Estudos e Alternativas de Porto Alegre (Idea), foi coordenador-executivo do 5º Fórum Social Mundial, publicou em seu blog (19.03.2019) uma análise bastante lúcida que fazemos questão de repercutir.

    O objetivo da Reforma da Previdência, em discussão na Câmara de Deputados, é drenar, em 10 anos, com a “nova previdência,” R$ 1 trilhão para o sistema financeiro, sob o pretexto que o sistema de seguridade social implantado pela Constituição Cidadã de 1988 está falido.
    Segue o artigo:

    Como financiar a previdência quando o trabalho desaparece e a riqueza cresce: capitalização individual ou taxação da riqueza?

    Por Jeferson Miola

    O ataque destrutivo do governo Bolsonaro aos direitos previdenciários não tem como objetivo ajustar o sistema de aposentadorias e pensões às mudanças demográficas, tecnológicas e laborais que ocorreram nas últimas décadas no Brasil.

    Paulo Guedes, o especulador assentado no Ministério da Economia, deixou claro que o objetivo primordial da PEC 6/2019 é substituir o sistema vigente, de repartição simples, baseado na solidariedade intergeracional e sustentado por toda sociedade por meio de impostos, taxas e contribuições, pelo regime de capitalização individual [artigo 201 da PEC], que no médio prazo pode desviar os R$ 350 bilhões anuais das contribuições de empregadores e trabalhadores para a especulação financeira.

    É uma cifra extraordinária, superior ao PIB de 140 países. Esse valor deixaria de ser aportado ao sistema público e solidário de previdência social – inviabilizando atuarialmente o regime de repartição simples – e entraria na engrenagem dos fundos financeiros da agiotagem internacional, sem nenhuma garantia de proteção vitalícia dos trabalhadores, sobretudo na velhice.

    A estratégia do governo Bolsonaro é abrir espaço fiscal para, em 10 anos, drenar R$ 1 trilhão para o sistema financeiro, sob o pretexto da “economia” gerada pela falaciosa “nova previdência”.

    O regime de capitalização, em que a Previdência deixa de ser uma política pública de proteção social para ser um negócio financeiro, não deu certo em nenhuma parte do mundo. No Chile, é causa do mais elevado índice de suicídios de idosos do mundo.

    Velhos e falsos mantras

    Os defensores do desmonte previdenciário repetem velhos e falsos mantras. Sustentam que [i] a previdência é deficitária e que [ii] os gastos previdenciários são a causa principal do desequilíbrio das contas públicas.

    A CPI da Previdência [relatório] demonstrou que a Seguridade Social é superavitária. Estudo da ANFIP [Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal] também evidenciou que a Seguridade Social, como concebida na Constituição Federal, prevendo benefícios previdenciários e fontes correspondentes de financiamento, sempre foi superavitária. Para se garantir, portanto, o equilíbrio e a sustentabilidade do sistema previdenciário, basta respeitar a CF.

    Considerando-se as fontes de financiamento previstas na Constituição, no período de 2007 a 2015 a Seguridade acumulou superávit de 524,3 bilhões de reais, como demonstra o gráfico da  ANFIP:


    De outra parte, é desonesto culpar a Previdência pelo desequilíbrio fiscal. De 2005 a 2015, as despesas com previdência totalizaram R$ 2,957 trilhões. No mesmo período, o país dispendeu R$ 2,528 trilhões somente em juros da dívida, afora os gastos com amortização, confirmando-se como importante gargalo do orçamento da União:

    Apesar do montante de juros pagos nesse período, o saldo da dívida, que em 2005 estava na casa dos R$ 2,08 trilhões, em 2015 disparou para R$ 4,14 trilhões – é como enxugar gelo.

    A recessão econômica e o desemprego comprometem o equilíbrio da seguridade social, porque diminuem a arrecadação federal e os aportes previdenciários. A grande urgência nacional, por isso, deveria se concentrar na reconstrução da economia brasileira e no enfrentamento dos problemas estruturais da dívida e da injustiça tributária, não na destruição do sistema previdenciário.

    Modelo proposto por Bolsonaro é genocida

    É pacífico que a política previdenciária que o mundo contemporâneo conhece, inspirada na Alemanha de Bismarck do final do século 19, requer atualizações para preservar um sistema de proteção social capaz de assegurar dignidade e justiça para trabalhadores quando concluem o longo ciclo de vida dedicado ao trabalho – nunca inferior a 35, 40 ou mais anos de trabalho.

    Qualquer sistema público, para garantir proteção vitalícia do trabalhador, deve ser atualizado vis a vis as mudanças demográficas, a expectativa de vida ao nascer, a expectativa de sobrevida, a dinâmica do mercado de trabalho e, em especial, a produção e reprodução social da riqueza.

    O sistema de capitalização proposto por Bolsonaro, todavia, ao invés de proteger o trabalhador por toda a vida, tem prazo de validade limitado, pois dura apenas enquanto durar o “saldo disponível” da “conta individual de investimento” do trabalhador. Se o fundo vai a falência, o que não é incomum nas crises cíclicas do capitalismo, o prejuízo irreversível para o trabalhador pode chegar antes mesmo da aposentadoria.

    A natureza macabra do sistema de capitalização pode ser facilmente comprovada. Tome-se por exemplo o trabalhador que se aposenta aos 60 anos e “consome” o “saldo disponível” da “conta individual de investimentos” depois de 10 anos, ao alcançar a idade dos 70 anos. A partir daí, como esse aposentado já não possuirá “saldo disponível” na sua “conta individual de investimento”, ele então ficará desamparado, sem cobertura previdenciária pelo período remanescente de vida. Ou seja, torna-se um indigente – e, então, a saída é abreviar tragicamente sua vida.

    O efeito dessa realidade, no Chile, é o suicídio recorde de idosos desesperados e desalentados. O regime de capitalização, que foi imposto no país andino pelo sanguinário Pinochet em 1981, seguindo as idéias de economistas da mesma escola do Paulo Guedes, é um modelo genocida.

    O professor da Universidade do Chile e conselheiro regional da OIT, Andras Uthoff, explica que o regime de capitalização transformou chilenos adultos de classe média em idosos pobres [ler aqui]. Ele lembra que

    quando a reforma foi implantada, prometia-se uma aposentadoria de 70% da média dos salários que a pessoa recebera durante a vida ativa. Hoje em dia, as taxas de reposição são em média de 35%. Quer dizer que a renda dessas pessoas diminuiu 65%, é uma mudança muito grande. Você vive a vida de trabalhador como classe média. Ao sair dela, se torna pobre”.

    Antecipando o fracasso da proposta do Bolsonaro, Uthoff alerta que, mesmo com os subsídios estatais criados por Bachelet em 2008 para tentar corrigir a crueldade do regime de capitalização, atualmente 79% das pensões estão abaixo do salário mínimo chileno [que equivale a 1.810 reais], e “44% dos aposentados vive abaixo da linha de pobreza, ganhando menos de 600 reais por mês”.

    A solução é taxar a riqueza para pagar aposentadorias e pensões

    Pesquisa realizada em 2018 pelo Laboratório de Aprendizado de Máquina em Finanças e Organizações [LAMFO] da UNB projeta que até 2026, ou seja, em apenas 7 anos, 54% das profissões formais no país poderão ser substituídas por robôs e programas de computador [aqui].

    Se esse prognóstico se confirmar, isso corresponderia ao desemprego – ou desocupação – de cerca de 30 milhões de trabalhadores formais, que serão substituídos por robôs. Ao exército dos atuais 13 milhões de desempregados e outros milhões de desalentados, em poucos anos se adicionará esse enorme contingente.

    Como a pesquisa abrange apenas as profissões substituíveis por robôs, essa estimativa deve crescer de modo significativo se consideradas também as atividades humanas passíveis de substituição por inteligência artificial, o que ocorrerá de maneira intensiva em distintas áreas do conhecimento, como das profissões da saúde, de gestão, contabilidade, finanças e outras.

    Outro estudo, do sociólogo italiano Domenico De Masi, chega a resultado semelhante à pesquisa do LAMFO/UNB. De Masi avalia que até 2030, ou seja, no curso de 1 década, cerca de 60% dos postos de trabalho que hoje conhecemos não mais existirão.

    O desaparecimento do trabalho humano é uma característica marcante da fase atual do capitalismo monopolista. O desaparecimento do trabalho, contudo, não compromete a acumulação de riqueza. Ao contrário disso, a riqueza gerada aumenta continuamente, porém, fica cada vez mais concentrada.

    Com o avanço da robótica, da inteligência artificial, da nanotecnologia e das novas tecnologias, será necessário menos quantidade de trabalho humano para se produzir mais bens, serviços e riquezas.

    De Masi considera contraproducente, por isso, se continuar taxando o trabalho para sustentar o sistema de aposentadorias e pensões. No entendimento dele, é preciso taxar a riqueza:

    Quanto mais se aumentam os ganhos de produtividade com tecnologia, mais cresce a riqueza dos empreendedores. Oito pessoas têm metade da riqueza da humanidade. Isso não pode continuar ao infinito. Na sociedade industrial, foi dado ao trabalho uma importância que antes não havia e o ser humano foi tratado como máquina. Agora, esse trabalho pode ser relegado a elas [as máquinas]. Não serão mais os trabalhadores a serem taxados, mas sim a geração de riqueza produzida pela tecnologia.

    Ao questionar sobre como serão pagas as pensões e aposentadorias se haverá redução de postos de trabalho e da quantidade de pessoas trabalhando, o próprio De Masi responde:

    Teremos mais riqueza. Hoje, quem trabalha paga pelo que recebem os pensionistas e aposentados. No futuro, como os trabalhadores serão sempre menos e a riqueza produzida será sempre maior, o recolhimento deverá ser feito sobre a base da riqueza e não dos trabalhadores. É uma revolução. Haverá menos trabalhadores, mas produzirão muito mais riqueza [aqui]”.

    É irrealista, nesse sentido, em pleno século 21, se continuar pensando financiar o sistema de aposentadorias e pensões centralmente através da tributação do trabalho.  A solução para o sistema previdenciário do mundo contemporâneo é taxar a riqueza produzida para financiar o pagamento das aposentadorias e pensões.

    Os privilégios tributários obscenos dos ricos no Brasil

    A tributação da riqueza no Brasil só não é menos obscena que a obscena concentração da renda e da riqueza socialmente produzida.

    Um punhado de acionistas dos Bancos Itaú e Bradesco, por exemplo, receberam R$ 43 bilhões em dividendos no exercício de 2018, porém não tiveram de desembolsar um único centavo sequer de impostos.

    Os proprietários, sócios ou executivos de empresas que recebem 100 mil, 400 mil, 1 milhão ou 5 milhões por mês via distribuição de dividendos, não pagam nada de imposto, ao passo que o trabalhador que recebe R$ 4.664,68 de salário mensal desconta 27,5% de imposto de renda.

    Essa pornografia tributária é uma obra inesquecível brindada à oligarquia rentista e parasitária por FHC no primeiro ano do período do seu governo [1995].

    Os proprietários rurais, que se beneficiam da valorização astronômica das terras que servem de reserva de valor, ainda são beneficiários pela valorização histórica das commodities, mas pagam ao redor de R$ 800 milhões de ITR [Imposto Territorial Rural] ao ano, ou irrisórios 0,02% das receitas da União. Além disso, os produtores rurais são desonerados dos impostos de exportações. Qualquer cidadão urbano paga em IPTU e IR, proporcionalmente, muito mais que um latifundiário paga de ITR e outros impostos diretos.

    O imposto sobre herança, de outra parte, representou 0,12% do PIB em 2016, bastante inferior à Bélgica, que arrecadou 0,8%. O economista André Calixtre estima que

    a aplicação do Imposto sobre Grandes Fortunas tenha potencial de arrecadar mais de R$ 70 bilhões (incidindo sobre patrimônios acima de R$ 100 milhões), o que teria efeito desejável de qualquer imposto sobre estoques: os patrimônios tendem a se redistribuir nos anos seguintes, reduzindo gressivamente o potencial arrecadatório, mas cumprindo seu papel de reduzir desigualdades rompantes” [aqui].

    São notórios, além disso, os mecanismos de desonerações tributárias, de isenções e favores fiscais concedidos ao capital sem o cumprimento de contrapartidas como expansão produtiva, ampliação de postos de trabalho e preservação ambiental.

    Se chegou a hora de mudar a previdência – e isso é duvidoso, a se considerar os velhos e falsos mantras repetidos pelo governo –, é porque então chegou a hora de se taxar a riqueza gerada pelo trabalho humano e pela tecnologia para pagar as aposentadorias e as pensões da população.

    No exaustivo estudo A reforma tributária necessária [aqui], da ANFIP, estão expostas diretrizes para uma reforma tributária que promova justiça tributária, ajude a diminuir as disparidades sociais e regionais, e assegure o financiamento sustentável de políticas Estado que têm sentido civilizatório.

    O regime de capitalização individual proposto na PEC 6/2019 é o germe da barbárie que, se adotado no Brasil, transformará o país no campeão mundial de suicídios de idosos, desbancando o Chile desse posto vergonhoso.

    JEFERSON MIOLA – Integrante do Instituto de Debates, Estudos e Alternativas de Porto Alegre (Idea), foi coordenador-executivo do 5º Fórum Social Mundial.

  • Em nome de Deus querem neutralizar o Sínodo

    O jornalista Flávio Tavares, no jornal O Estadão, publica artigo em defesa do Sínodo e da Amazônia. “O sínodo sobre a Amazônia será, de fato, o desdobramento concreto da encíclica Laudato Si’, do papa Francisco, sobre “os cuidados com a casa comum”, nosso planeta. Lançada em maio de 2015, é o mais importante documento do século. Profundo, analítico e didático, alerta sobre a responsabilidade de cada um na vida no planeta. Denuncia a horda brutal da cobiça que, alegando um falso “progresso”, entende que a natureza é algo a destruir e malbaratar”.

    Segue o artigo:

    Em nome de Deus
    O sínodo é uma reunião interna da Igreja e só a ela cabe definir os próprios rumos.

    A vulgaridade que se espalha por todos os cantos passou a invocar o nome de Deus como se fosse um produto nas prateleiras dos supermercados. Não se trata sequer do ignorante, mas respeitoso temor reverencial de séculos atrás, quando os raios e trovões faziam tremer por ser “a ira divina”. Agora se invoca Deus a granel, na política ou no dia a dia, até para os atos mais diabólicos…

    Quando, porém, o papa e a Igreja Católica buscam estudar e analisar a progressiva degradação do planeta, muitos se esquecem de que a vida é a obra suprema. O próximo sínodo dos bispos sobre a Amazônia, a realizar-se em Roma, é o exemplo concreto da preocupação que deveria abarcar toda a sociedade, não apenas os católicos e os luteranos tradicionais, mas, mesmo assim, é atacado.

    A devastação da Amazônia é um horror concreto, agravado nas últimas décadas pela mineração e pelo desmatamento predatórios, que competem entre si sobre quem degrada mais… A região em que chovia todos os dias (e as reuniões se marcavam para “antes” ou “depois” da chuva) agora já padece de seca, numa antevisão do deserto. A maior bacia hidrográfica do planeta abrange nove países sul-americanos e os bispos da região (não só do Brasil) analisarão ações e estratégias para enfrentar o que se agrava a cada dia com o desmatamento e com rios e igarapés contaminados pelo mercúrio da mineração.

    No Brasil, porém, o ministro Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (sucessor do antigo SNI dos tempos ditatoriais), está preocupado com o sínodo e o considera uma afronta ao governo Bolsonaro e à própria soberania do Brasil. “Nós não damos palpite sobre o Deserto de Saara ou o Alasca”, disse, adiantando que o governo pretende neutralizar as conclusões que surjam do sínodo…

    Por que “neutralizar”, se a reunião será em outubro e nem se sabe o que recomendará?

    Convocado pelo papa Francisco em 2017, um ano antes da eleição de Bolsonaro, o sínodo é uma reunião interna da Igreja e só a ela cabe definir os próprios rumos. O bispo de Marajó, dom Evaristo Spengler, um dos relatores do encontro (junto a prelados de outros oito países) lembra que a Igreja “não pode ser neutra ou impassível” diante de um crime causado pela visão de lucro fácil. Está em risco um exuberante bioma que se estende das montanhas do Peru, junto ao Oceano Pacífico, até o Atlântico.

    O ministro do Gabinete de Segurança Institucional foi comandante militar na Amazônia brasileira e hoje é a figura mais influente do governo, mas se equivocou ao não entender a missão da Igreja. Amar o planeta não será, antes de tudo, amar a humanidade? No equívoco teve até a companhia de alguns que – alheios à realidade interna da Igreja – fantasiaram situações ou divisões há muito inexistentes no catolicismo ou entre os membros do Conselho Mundial de Igrejas.

    O sínodo sobre a Amazônia será, de fato, o desdobramento concreto da encíclica Laudato Si’, do papa Francisco, sobre “os cuidados com a casa comum”, nosso planeta. Lançada em maio de 2015, é o mais importante documento do século. Profundo, analítico e didático, alerta sobre a responsabilidade de cada um na vida no planeta. Denuncia a horda brutal da cobiça que, alegando um falso “progresso”, entende que a natureza é algo a destruir e malbaratar, a desrespeitar e odiar. E que tudo, até o horror, é válido em nome do lucro…

    A encíclica deu nova dimensão à luta pela preservação ambiental. Ao superar as ribombantes frases declaratórias dos governos e governantes, saltou dos discursos para a consciência dos indivíduos, a partir do conceito de vida.

    O meio ambiente surgiu (ou ressurgiu) como tema teológico, ligado umbilicalmente à vida na Terra ou à nossa existência e ao que nos rodeia. Anos antes, em 2008, o papa Bento XVI havia definido quatro novos “pecados capitais” – a poluição ambiental foi um deles, ao lado da manipulação genética, das drogas e da exploração econômica que provoca a desigualdade social.

    Mas na voraz sociedade de consumo (que naturalmente nos conduz ao hedonismo e ao prazer) a ideia de “pecado” já não tem a profundidade de séculos atrás. Hoje, se não somos capazes de dominar os sete pecados capitais da tradição bíblica – gula, luxúria, avareza, ira, soberba, vaidade e preguiça –, como incorporar os quatro apontados no século 21?

    A encíclica sobre “os cuidados com a casa comum” abriu nova reflexão a respeito da responsabilidade não só dos governantes ou dos empresários, mas de cada um de nós em torno da vida no planeta. O sínodo busca encontrar caminhos para concretizar o que a encíclica aponta.

    A Igreja não é um ente etéreo. Historicamente, está comprometida com a defesa da vida. Aquilo que a teologia chama de eternidade é, em essência, a manutenção da vida tal qual foi estabelecida pelo Deus criador, seja ele qual for – o “fiat lux” da Bíblia ou o “big-bang” da ciência.

    Só há eternidade se houver o planeta. Sem ele, é o nada!

    Afinal, por que defender o meio ambiente apenas nas grandes conferências de chefes de Estado e, logo, relegar as palavras a plano inferior?

    A Eco-92, realizada há 27 anos no Rio de Janeiro, elaborou a Agenda 21 como cartilha a adotar no novo século para nos salvar da hecatombe próxima. Em 2012, também no Rio, nos 20 anos da reunião anterior, nova reunião de cúpula dos chefes de governo reiterou a advertência, sem que o essencial houvesse mudado. O aquecimento global continuou, sem medidas urgentes de reversão.

    Agora, porém, quando o sínodo dos bispos sobre a Amazônia busca saídas para mitigar e extirpar o horror numa região sensível do planeta, há quem use até “o nome de Deus” para se opor à iniciativa…

    *JORNALISTA E ESCRITOR, PRÊMIO JABUTI DE LITERATURA EM 2000 E 2005, PRÊMIO APCA 2004, É PROFESSOR APOSENTADO DA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

  • A encruzilhada do catolicismo brasileiro

    O catolicismo brasileiro está diante de uma encruzilhada política. Nesse momento histórico complicado, se avizinham as eleições para CNBB, com rumores de mudança em seus estatutos. Estará nas mãos do episcopado brasileiro resgatar uma tradição profética recente, que fez da Conferência dos Bispos uma das instituições mais respeitadas do Brasil na defesa dos direitos humanos, e de grande credibilidade no dinamismo de suas ações – como a Campanha da Fraternidade. Ou optar por cair em um triunfalismo fundamentalista, alimentado por doses cavalares de formalismo litúrgico, distanciamento da vida concreta do povo, salpicada com generosas pitadas de pentecostalismo.

    Neste último caso, estará a Igreja do Brasil jogando fora mais de cinquenta anos de vanguarda pastoral e protagonismo social, iniciados em 1952 por iniciativa do grande dom da Igreja Católica no Brasil, o arcebispo Hélder Câmara. Ao mesmo tempo, ela poderá se abraçar de vez com o que se tem de mais reacionário no catolicismo e na sociedade. Fascismo na política, moralismo nos costumes e um modelo de Igreja clerical e autorreferencial. Tudo isso em franca oposição ao magistério do Papa Francisco e da sua agenda social.

    Entre o episcopado, há uma cautela excessiva na abordagem dos grandes temas nacionais. Quando confrontados por detratores, silenciam. No sigilo dos bastidores, muitos leigos pensam que falta ousadia e coragem. No clero, sobretudo dentre os mais jovens, não poucos conferem mais importância aos paramentos e vestes que ressaltem a sua condição clerical do que a animação pastoral e o serviço ao povo de Deus. Estes preferem ostentar sua condição de padre com batina e clergyman se escondendo do povo através dos formalismos e das normativas eclesiásticas. Coisas essas muito criticadas pelo Papa, totalmente avesso ao clericalismo e ao triunfalismo.  Não é incomum que sacerdotes considerem a CNBB e suas iniciativas, especialmente a Campanha da Fraternidade, como  coisas muito “políticas”…

    Quem viu ou conviveu com bispos como Luciano Mendes de Almeida, Antônio Fragoso, Adriano Hypólito, Paulo Evaristo Arns, Tomás Balduíno, Waldyr Calheiros ou Aloísio Lorscheider, sente muita diferença. O profetismo pessoal destes e de muitos outros, que oferecia uma pronta resposta aos desafios que se impunham à Igreja e à sociedade, foi substituído por um “profetismo institucional”. Este, por sua vez, é muito precavido nos termos e nas expressões. Embora os pronunciamentos sejam acertados, estão sempre um passo atrás dos acontecimentos. A reação parece lenta demais em um mundo marcado pela comunicação digital permitida pela internet e pelas redes sociais. Claro que temos hoje bispos-profetas, como Dom Adriano Ciocca, Dom Joaquim Mol, Dom Evaristo Spengler, Dom Erwuin Krautler ou Dom Antônio Carlos Cruz. Mas, no conjunto do episcopado atual, estes representam uma “minoria abraâmica”, para ficar nas palavras de Dom Hélder Câmara.

    Do ponto de vista eclesial, a eleição na CNBB marcará também os rumos de uma Igreja no Brasil que parece vacilante diante do magistério de Francisco. Não se percebe aquele entusiasmo efusivo de outrora – e com outros pontífices – em relação aos ensinamentos e orientações vindas do Papa. Na verdade, há uma recepção morna às diretrizes vindas do Bispo de Roma. Inicialmente, verifica-se que os discursos e as falas oficiais são respeitosas, e sempre se faz referência à colegialidade episcopal, à obediência ao Bispo de Roma, ao caminhar “cum et sub Petro”. São poucos os grupos que criticam abertamente o Papa Francisco aqui no Brasil. No entanto, mudanças cotidianas são pouco sentidas e o modelo de formação presbiteral ainda é o mesmo de outros tempos. Os escândalos de abuso sexual em várias partes do mundo indicam que alguma coisa precisa ser feita nesse sentido. Da mesma forma, o perfil de parcela de boa parte do episcopado brasileiro está mais próximo de João Paulo II e Bento XVI do que de Francisco.

    Dessa forma, os documentos papais, primorosos em sua crítica e proféticos em sua denúncia, trazem as sementes de um cristianismo mais sintonizado com as práticas de Jesus, e resgatam um caminho eclesial que foi abandonado por mais de trinta anos, cujo início se deu com João XXIII através do Concílio Vaticano II. No entanto, encontram pouco eco nas dioceses organizadas sob o modelo da grande paróquia católica. Fala-se até muito de Francisco, as emissoras católicas reproduzem suas missas, repercutem suas viagens, mas pouco se aprofunda o conteúdo de seus textos, suas pregações e suas homilias. Ao mesmo tempo, aqueles que mais reivindicam maior presença da mensagem de Francisco nos ambientes católicos são exatamente os que hoje são atacados por muitos de seus irmãos na fé. São chamados de hereges, de vergonha da Igreja, de anticristãos, de falsos católicos e de comunistas. Os comentários feitos nas postagens dos encontros e assembleias da Pastoral da Juventude no Facebook são um triste exemplo disso.

    De toda a forma, à frente da barca de Pedro está um Pontífice que dá sinais expressivos a respeito da direção que a Igreja deve tomar. Sua agenda social se resume nos três “T’s”: Terra, teto e trabalho. Bergoglio canonizou Dom Oscar Romero e recentemente substituiu um cardeal arquiconservador por um padre perseguido por este mesmo bispo e que foi aluno de Gustavo Gutierrez, um dos mentores da Teologia da Libertação. Na semana passada, o Papa mandou retirar a suspensão “ad divinis” do poeta e padre nicaraguense Ernesto Cardenal, também muito identificado com a Teologia Latinoamericana.

    O Sínodo da Família sinalizou uma abertura pastoral aos recasados. O Sínodo sobre os jovens reforçou o protagonismo juvenil. Em sua última exortação sobre a santidade, Gaudete et Exsultate, o papa insiste em um modelo de santidade que se solidariza com a dor dos outros. Ao mesmo tempo, rejeita certa presunção de santidade baseada no sentir-se “superior aos outros por cumprir determinadas normas” ou por ser fiel “a um certo estilo católico” (n. 49). Também rejeita certa visão de santidade baseada na “obsessão pela lei” e na “ostentação no cuidado da liturgia, da doutrina e do prestígio da Igreja (n. 59).

    Na semana passada, Francisco promoveu um encontro com 114 bispos presidentes de conferências episcopais para discutir o abuso sexual na Igreja.  A magnitude desse encontro o torna sem precedentes na história da Igreja, fazendo desse momento uma espécie de “pré-conclave” ou de “mini-concílio”, nas palavras do historiador italiano Alberto Melloni. O Bispo de Roma foi duplamente destemido: por “tocar o dedo na ferida” de forma objetiva, transparente e sem subterfúgios; e porque, em nome da justiça, arriscou um grande debate público a partir do qual poderia surgir uma oposição mais direta a seu pontificado, capaz de influir em sua própria sucessão.

    Consequentemente, não podemos desconectar o magistério papal da realidade eclesial brasileira. Ventos contrários as mudanças propostas por um papa que “veio do fim do mundo” ecoam aqui também. Muitos não se conformam com seu espírito de abertura e com a sua eclesiologia. Dentro e fora da Igreja também, porque o Papa é um crítico severo do livre-mercado, da exploração dos trabalhadores e da situação dos migrantes. Francisco hoje talvez seja o único líder em escala mundial que pode ser chamado de estadista. E isso incomoda muita gente.

    No Brasil, não é diferente. Talvez seja essa uma explicação parcial sobre a sensação de “empurrar com a barriga” muitas vezes sentida em relação às diretrizes do Bispo de Roma em nosso país. Claro que ninguém admite isso, mas em muitos lugares, se não fosse pela menção na Oração Eucarística, um desavisado nem saberia o nome do atual Vigário de Cristo. O Papa pede um novo modelo de Igreja, de leigo, de padre, de bispo e de ação pastoral. Isso causa desconfortos e constrangimentos para quem entende que a Igreja ideal para o século XXI é aquela proposta pelo Concílio de Trento, quinhentos anos atrás.

    Fora dos muros eclesiais, Francisco hoje causa arrepios nos serviços de inteligência do atual governo. Um dos generais responsáveis pelos arapongas admitiu publicamente que padres, bispos e agentes de pastoral estão sob vigilância, espionados pela Abin por causa do Sínodo da Amazônia. Sem desconsiderar a preocupação em relação as críticas que podem ser feitas na reunião de outubro próximo à atual gestão, desgastando ainda mais a imagem já corroída do país, o governo atirou no Sínodo para acertar na eleição da CNBB. Por isso, sua importância.

    Se levarmos em consideração os apoios (explícitos e velados) que parte da hierarquia católica manifestou nas eleições passadas, seria um enorme alívio para Bolsonaro e seus aliados que um “amigo” ocupasse a presidência da conferência episcopal. E as redes sociais, os fatos ocorridos ao longo da campanha e as informações de bastidores são reveladoras sobre quem são os “parceiros católicos” do presidente da República. É aqui que reside a encruzilhada de poder que envolve o episcopado brasileiro. É muito difícil que haja um prelado que seja, ao mesmo tempo, alinhado com a eclesiologia de Francisco e afinado com as ideias bolsonaristas. Logo, um aliado do governo federal na presidência da CNBB certamente seria alguém que, no mínimo, se sente desconfortável com as orientações e com o modelo de Igreja que o Papa propõe.

    É claro que, se nefasta possibilidade ocorresse não seria uma oposição frontal, aberta e pública. Nas falas públicas, o que seria visto são o apelo à unidade da Igreja e à solicitude para com o Pontífice Romano. Portanto, é necessária sensibilidade no olhar para perceber as nuances presentes nos jogos de poder da política eclesiástica. Olhar o cenário internacional da Igreja e os movimentos realizados no Brasil podem nos indicar quem seria o “amigo” do Planalto.

    Indícios já existem. Há algum tempo, o cardeal Burke – o principal opositor do Papa – esteve em algumas cidades brasileiras, duas delas tem algo comum: o mesmo bispo esteve ou está nelas. Outro indício se apresentou nesse início de ano. Dizem em alguns salões paroquiais que uma grande diocese brasileira realizará um evento (ou este ocorrerá em seu território) em abril com o Cardeal Gerhard Müller, que recentemente publicou um “manifesto da fé”. Na verdade, foi uma forma rebuscada de fazer críticas contundentes ao magistério de Francisco. Se os rumores forem confirmados, teremos outro opositor do Papa em uma grande cidade do país há poucos dias da assembleia-geral dos bispos que possivelmente definirá novos estatutos e que escolherá um novo presidente, secretário-geral (ou serão secretários?) e comissões episcopais.  Talvez a oposição ao Bispo de Roma fique evidente demais para o titular dessa diocese a ponto dele ser o anfitrião do evento. Mas ele pode ser ou chancelado por um preposto ou promovido pelos mesmo grupos que “realizaram” a turnê brasileira de Raymond Burke há alguns anos.

    Enfim, haverá chance para um aliado do planalto ocupar a presidência da conferência dos bispos? As citações eclesiásticas feitas pelo ex-governador do Rio de Janeiro terão efeito sobre a assembleia da CNBB em abril? Em breve teremos as respostas.

  • Governo Bolsonaro – 50 dias

    Não houve um período de “lua de mel”, como costuma acontecer em todo início de governo eleito: ao tomar posse, já havia as denúncias relativas ao motorista de Flávio Bolsonaro, Fabrício Queiroz, de ter recebido uma quantia enorme em apenas um ano. O não comparecimento para prestar depoimento, tanto por parte de Queiroz como por parte do ex-deputado estadual, só fizeram aumentar as suspeitas em relação ao caso.

    Seguiu-se a isto a designação pela polícia do assassino da ex-vereadora Marielle Franco, hoje foragido. Tanto a mãe quanto a mulher deste ex-policial e miliciano trabalhavam no gabinete de Flávio Bolsonaro, o que confirma a proximidade da família com as milícias.

    A ida do presidente a Davos foi um fiasco junto à comunidade internacional. O discurso, que poderia ser de quarenta e cinco minutos não passou de seis. Posteriormente, o presidente e os membros do governo deixaram de comparecer a uma coletiva de imprensa. A avaliação da mídia internacional foi muito crítica: tanto o discurso quanto a ausência revelavam a pouca consistência deste governo.

    Aliás, a mídia no exterior tem sido muito reticente em relação ao governo Bolsonaro. Certamente, haverá apoio a medidas econômicas neoliberais, mas não passarão incólumes as posturas homofóbicas, antifeministas ou racistas, nem tampouco iniciativas autoritárias ou militaristas.

    Existe um processo de desmoralização do governo, que vem se mostrando incapaz de controlar os membros da família, de se relacionar bem com alguns quadros mais próximos, de gerir seu partido. Bolsonaro não parece preparado para o cargo que obteve.

    As medidas iniciais tomadas pelo novo governo revelaram com muita precisão que o discurso de campanha era, no essencial, verdadeiro:

    – O corte de direitos dos povos indígenas e quilombolas (transferindo a responsabilidade pela demarcação dos territórios para o Ministério da Agricultura, nas mãos do agronegócio, e esvaziando a FUNAI).

    – O fim do Ministério do Trabalho.

    – As secretarias da igualdade racial e de política pública para a população LGBTI desaparecem.

    – O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) é extinto.

    – Estabelece-se controle sobre as ONGs (em especial as entidades ambientalistas, os centros de defesa dos direitos humanos).

    Ainda no primeiro mês, tal como havia prometido na campanha, o governo liberou a posse de armas: cada pessoa poderá ter até quatro armas. Especialistas em segurança afirmam que, quanto mais armas disponíveis para os cidadãos, maior o risco de violência.

    – O campo da educação tem sido alvo constante: combate às universidades públicas, aos professores.

    – Impulso às privatizações (Eletrobrás, setores da Petrobras, leilões, venda da EMBRAER para a Boeing, etc.).

    – Reforço da subliminar “licença para matar”, “licença para agredir” (os membros de grupos vulneráveis).

    – Temas sobre os quais os membros do governo têm se manifestado de forma crítica: mulheres, feminismo, direitos sexuais e reprodutivos, luta pela descriminalização do aborto.

    – A relação com a grande mídia: ameaças, denúncias, etc. Em áudio de Bolsonaro, a Globo é alvo de discriminação.

    – A revelação de investigação por parte da ABIN e do GSI a respeito do Sínodo sobre a Amazônia, convocado pelo Papa, a se realizar em Roma, em outubro deste ano. (Este tipo de monitoramento ocorreu durante todo o período da ditadura militar, mas é inteiramente fora de propósito numa democracia: mais incomum é o serviço secreto revelar quem está investigando).

    As duas medidas mais importantes e as mais esperadas do governo:

    1. O pacote anticrime de Sergio Moro.
    2. O centro da proposta econômica do novo governo: a Reforma da Previdência (com apoio total do “mercado” e da grande mídia).
    1. O pacote anticrime tem uma marca evidentemente punitivista: reforça a ideia de que combater a criminalidade é prender mais. Ora, o Brasil já é o terceiro país do mundo em número de encarcerados: 700 mil, atrás apenas dos EUA e da China. A população carcerária dobrou nos últimos anos: nada indica que isto tenha promovido redução da violência.

    O segundo aspecto grave deste pacote é a “licença para matar” concedida aos policiais: ao invés de reforçar o papel da inteligência e da articulação entre as polícias, facilita a abordagem letal por parte dos funcionários da polícia, num país onde o número de mortes causadas por policiais já é enorme. Especialistas têm chamado a atenção para o fato de que, quanto maior o número de mortes produzidas pela polícia, maior o número de policiais mortos.

    1. A Reforma da Previdência vem sendo apresentada pela mídia como a solução para todos os problemas da economia: se não aprovada, o país vai quebrar; se aprovada, vai gerar emprego, os salários vão aumentar, a economia vai deslanchar.

    Ora, em primeiro lugar, é preciso lembrar o que foi provado pela CPI da Previdência (2018): não há “rombo” na Previdência, há superávit. A Constituição de 1988 previu recursos suficientes para a Seguridade Social (saúde, previdência e assistência). Tais recursos vêm do Estado, dos empregadores e dos empregados.

    Em segundo lugar, a Previdência não é o maior gasto público do país: é a dívida pública. Em 2018, a Previdência representou 25% da despesa e a dívida representou 40%. Destes 40%, uma parte significativa foi para pagar os juros da dívida: cerca de 350 bilhões de reais. Quantia que é dirigida para os mais ricos do país, apenas 1% da população. Por que? Porque a taxa de juros, de 6,5%, continua a ser uma das mais altas taxas de juros reais (descontada a inflação): somente 6 países têm taxas reais acima da nossa. Boa parte dos países têm taxas reais de 0 (zero) ou abaixo de zero. Se nossa taxa fosse baixa, não pagaríamos bilhões aos mais ricos.

    Além disso, só em isenções fiscais, o Brasil hoje abre mão de 350 a 400 bilhões de reais por ano (somente o governo federal).

    Em sonegação fiscal, o Brasil perde 500 bilhões por ano (e, hoje, temos tecnologia que nos permite localizar os sonegadores).

    Ao somarmos 350 bilhões (juros), 350 bilhões (isenções fiscais) e 500 bilhões (sonegação), temos 1 trilhão e 200 bilhões de reais – em um ano – que deixam de ser usados em políticas sociais (saúde, educação, transporte, etc.) e só servem a ricos e a empresários/banqueiros/rentistas. Ora, a Reforma da Previdência pretende arrecadar 1 trilhão em dez anos: não precisa, temos outras fontes certas e seguras.

    Não há necessidade desta Reforma da Previdência, que pretende economizar dinheiro tirando dos mais pobres, dos trabalhadores rurais e dos idosos. Precisamos estender a Previdência àqueles trabalhadores que não têm acesso a ela, precisamos cobrar mais dos mais ricos e pagar mais aos mais pobres.

    O principal objetivo da Reforma da Previdência de Bolsonaro é passar do regime de repartição – que é o atual, baseado na solidariedade social – para o regime de capitalização – que é individualizado. No regime de repartição todos contribuem, trabalhadores, empregadores e Estado. No regime de capitalização, só o trabalhador contribui (e, na maioria dos casos, só contribui quando está empregado). Assim, todos os períodos em que o trabalhador ficar desempregado, não contribuirá para a previdência e terá dificuldade de atingir o tempo mínimo de contribuição para obter a aposentadoria.

    O país exemplo do regime de capitalização é o Chile de Pinochet. Hoje em dia, 80% dos aposentados neste país recebe menos que o salário-mínimo de aposentadoria. Os grandes beneficiários deste modelo de Previdência não são os trabalhadores, são os bancos e os fundos de pensão[1].

    A verdadeira Reforma que permitiria reduzir as desigualdades e os privilégios seria a Reforma Tributária, de modo que os que ganham mais paguem mais impostos e os que ganham menos paguem menos (ou nada). Hoje, os mais ricos não pagam impostos sobre lucros e sobre dividendos: só um país no mundo, além do Brasil, tem esta regalia, a Estônia. Com uma Reforma Tributária progressiva, teríamos recursos mais que suficientes para as políticas públicas.

    Frente a esta ofensiva contra direitos, inclusive o pacote anticrime e o projeto de Reforma da Previdência, temos de desmascarar o conteúdo prejudicial à maioria e divulgar os efeitos demolidores que tais projetos teriam.

    [1] Sobre a proposta de Reforma da Previdência de Bolsonaro, ver as entrevistas do professor Eduardo Fagnani na Carta Capital, https://www.youtube.com/watch?v=e7j_izWR6fY e do ex-ministro da Previdência, Carlos Gabas, https://www.youtube.com/watch?v=CTzgfL_giTs .

    Foto de capa: site sputniknews.com/brasil

     

  • Crise para quem, cara pálida?

    Em 22 anos, de 1997 a 2018, o Estado brasileiro repassou para o sistema financeiro (e a turma que vive de renda) o equivalente a R$ 5,1 trilhões, tirados do Orçamento Anual da União (diga-se das Políticas Públicas de Saúde, Educação, Previdência, Transporte etc). Não, você não se enganou na leitura. É isso mesmo: R$ 5 tri!

    Segue artigo de Paulo Kliass, Publicado 13/02/2019 em OUTRAS PALAVRAS

    Superávit primário: história de uma fraude

    Nos anos 1980, surgiu a ideia de que o mais importante, na gestão das contas públicas, era garantir o pagamento de juros aos barões. O novo termo é fruto desta deformação

    Paulo Kliass

    É bem verdade que o famigerado termo do economês caiu um pouco em desuso nos meios dos “especialistas”, as figurinhas carimbadas sempre chamadas a fornecer suas opiniões nas colunas de economia dos “grandes” meios de comunicação. Afinal, não tem mesmo mais sentido ficar clamando pelo sacrossanto “superávit” quando os resultados fiscais têm apresentado – de forma sistemática desde 2014 – saldos negativos na abordagem do balanço dito “primário” das contas públicas.

    Mas não nos deixemos enganar. O fato de o resultado primário não ter sido superavitário depois de 2013 não significa que a essência da malandragem tenha sido abandonada. De modo algum! Muito pelo contrário! Lembremo-nos todos que essa metodologia “inovadora” no tratamento das contas públicas data ainda lá da década de 1980, no período em que os países do chamado Terceiro Mundo estavam atolados em dívidas externas e passaram a enfrentar dificuldades em honrar esses compromissos em moeda norte-americana. A maior parte dos credores era composta de bancos privados, que não queriam ficar sem receber sua parte no butim. Era o início do período que ficou conhecido como o da crise da dívida.

    Tendo em vista a impossibilidade de pagamento das obrigações junto à banca estrangeira, entram em cena os organismos multilaterais do financismo internacional. O Banco Mundial (BM) e, especialmente, o Fundo Monetário Internacional (FMI) se oferecem, generosa e voluntariamente, como guardiães da liquidez. Se propõem a honrar os compromissos dos países endividados para evitar perdas maiores e um risco de colapso sistêmico no âmbito financeiro, mas exigem como contrapartida que as tais nações “beneficiadas” passassem a assumir internamente a agenda de liberalização e privatização.

    Privilégios para o financismo

    E aqui entra a novidade espoliadora. Para evitar que houvesse outra crise mais à frente, os defensores do financismo apresentam, como um dos itens das “condicionalidades” da dita “ajuda”, o compromisso dos governos com uma nova sistemática de condução da política fiscal. Bingo! A partir de então não seria necessário buscar o superávit nas contas públicas de forma geral. O pequeno “detalhe” era a exigência de superávit nas contas primárias. E o que isso significa na prática? Mais do que mero adjetivo, o sentido era de compromisso em buscar reduzir despesas e ampliar receitas apenas nas contas não-financeiras (as tais contas “primárias”) dos orçamentos. Por meio de tal estratagema, sobrariam recursos assegurados para o cumprimento das despesas financeiras dos governos. Entenda-se aqui como o pagamento de juros e demais serviços da dívida pública.

    Ao longo dessas últimas três décadas a prática se generalizou e hoje em dia a grande imprensa trata as duas metodologias como sinônimos. Uma grande falácia! Isso porque a aplicação da regra do “resultado primário” confere um tratamento privilegiado aos gastos públicos associados ao mundo financeiro. Essas rubricas são intocáveis. Já as demais despesas – a exemplo de saúde, previdência, educação, assistência, saneamento, ciência e tecnologia, investimento, pessoal, etc – podem ser comprimidas para obtenção de um superávit que vai justamente para o pagamento dos compromissos financeiros inquestionáveis.

    Precisamos de algum número para comprovar o que escrevo por aqui? Pois então, basta que consultemos a página do BC e então poderemos identificar os valores que foram despendidos com pagamento de juros ao longo de 2018. Uma loucura! Entre janeiro e dezembro do ano passado, por exemplo, foram gastos exatamente R$ 379 bilhões para esse fim. Ou seja, o país seguia quebrado, com mais de 13 milhões de desempregados, quase 30 milhões de pessoas sub-aproveitadas em suas atividades na informalidade do mercado de trabalho, falências por todos os lados, cortes orçamentários por todos os cantos. Mas os recursos para o setor financeiro não poderiam faltar de maneira alguma.

    Em 2018: país quebrado e R$ 380 bi com juros

    O governo Temer passou seus longos e tenebrosos dois anos reclamando por uma Reforma da Previdência, decretou a Emenda Constitucional “do Fim do Mundo” congelando as despesas orçamentárias (não financeiras, que fique bem claro) por longos 20 anos e provocou um verdadeiro desmonte do Estado com o argumento de que não havia recursos. Uma grande mentira! O dinheiro público existia, como ainda existe. O problema é que ele é direcionado para outras prioridades. No caso, para o poderoso jogo de interesses e de pressão do sistema financeiro.

    O governo do capitão e seu porta-voz na economia vão pelo mesmo caminho. Para Paulo Guedes, a “Reforma” da Previdência seria a mãe de todas as reformas. Sem ela, as contas públicas ficariam inviabilizadas agora e no futuro. Em troca da destruição da Previdência Social, ele acena com a economia de R$ 1 trilhão ao longo das duas décadas à frente. Mentira! Está mais do que provado que basta que as atividades econômicas voltem a crescer e os níveis de emprego sejam recuperados para que as necessidades de financiamento atualmente existentes no Regime Geral da Previdência Social (RGPS) sejam eliminadas.

    O problema é outro. Trata-se de saber quem terá a coragem política de propor a mudança desse modelo perverso de transferência de recursos para o sistema financeiro e para a rede que se alimenta do parasitismo em seu entorno. Afinal, desde que o Tesouro Nacional começou a contabilizar uma série estatística de apuração de “resultado primário” os dados são estarrecedores. Entre 1997 e 2018, por exemplo, foram repassados ao sistema financeiro o equivalente a R$ 5,1 trilhões dos 22 Orçamentos Anuais da União do período. Não, você não se enganou na leitura. É isso mesmo: R$ 5 tri!

    Entre 1997 e 2018: R$ 5 trilhões com juros

    E tem mais. Entre 1998 e 2013, foram superávits religiosamente gerados e cumpridos. Eram valores que giravam em torno de 1,9% do PIB na média anual. Com o recorde tendo ocorrido justamente durante o primeiro mandato de Lula. Naquele momento, a duplinha dinâmica Antonio Palocci (Ministério da Fazenda) e Henrique Meirelles (Banco Central) chegou ao absurdo de alcançar uma média de 2,5% do Produto Interno entre 2003 e 2005. Um sistema de extração de recursos de toda a sociedade, com a intenção de promover um redirecionamento dos mesmos para uma reduzida casta de privilegiados.

    A partir de 2014, a economia começou a patinar e as contas públicas passaram a apresentar seus primeiros problemas. Mas apesar dos déficits primários gerados desde então, a cada exercício a conta de juros no orçamento federal era religiosamente cumprida. No total foram pagos escandalosos R$ 1,8 trilhões ao longo dos 5 anos de resultado fiscal deficitário em 5 anos. Pois é! Crise para quem, cara pálida?

    A mudança nessa verdadeira eternização da perversidade e da injustiça social exige mais do quem uma simples retomada do crescimento. É necessário que a sociedade brasileira tome para si a responsabilidade de romper com esse pacto de privilégios do financismo. Um modelo que aponte para o desenvolvimento e a redução das desigualdades não pode conviver com tamanha fonte de disparidade. A agenda das forças progressistas deve incorporar a redefinição dessa metodologia nas contas públicas, que nos é apresentada como “natural”. Além disso, necessitamos uma revisão das amarras da Lei de Responsabilidade Fiscal e a libertação do País das condições draconianas de gestão da dívida pública sob o império de juros elevados. Enfim, tudo isso passa pelo fim da ditadura do superávit primário.

    Paulo Kliass – Possui graduação em Administração Pública pela Fundação Getulio Vargas – SP (1985), mestrado em Economia pela Universidade de São Paulo (1988) e doutorado em economia pela UFR – Sciences Économiques – Université de Paris 10 – Nanterre (1994) e pós doutorado em economia na Université de Paris 13. Desde 1997 é integrante da carreira de Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental, vinculada ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Informações coletadas do Lattes em 03/12/2018.

  • Por direitos ameaçados e por direitos nunca conquistados

    Dia 20 de fevereiro (quarta-feira) acontecerá o lançamento oficial da Comissão Arns, às 11 h, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, no Largo de São Francisco, São Paulo. Notícia publicada por Lourdes Nassif – 13/02/2019 em jornal GGN. Segue a publicação:

    Está nascendo a nova Comissão de Defesa dos Direitos Humanos: Dom Paulo Evaristo Arns dará nome e Margarida Genevois será a presidenta de honra. Por que Arns? Por que Margarida Genevois?

    Padre Ticão e Professor Waldir nos dão uma pista, no livro Dom Paulo Evaristo Arns – Cardeal das Periferias, dos Pobres e da Justiça:
    Crescem assustadoramente os atos de injustiça e autoritarismo praticados pelo governo militar. Os terríveis atos institucionais eram decretados a seu bel prazer, dando-lhe poderes para agir do modo que melhor lhe aprouvesse a fim de reprimir qualquer manifestação contrária ao sistema imposto. O povo estava acuado e amedrontado diante de tantas perseguições.

    São inúmeras as declarações feitas por Dom Paulo e registradas em livros, jornais e revistas sobre as perseguições sofridas pelo povo que ocupava as periferias, sobremaneira por aquelas pessoas que exerciam algum tipo de liderança. Como ajudar, proteger ou mesmo socorre a tantos? (…)

    Certamente inspirado e conduzido pelo amor incondicional aos mais pobres, Dom Paulo, a exemplo de Paulo VI que havia feito em Roma, decide constituir em São Paulo[ em 1972] a Comissão de Justiça e Paz.

    Artigo da Folha de S. Paulo, assinado por Eleonora de Lucena, nos conta de Margarida Genevois:
    Quando começou a trabalhar na Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, em 1972, Margarida Genevois falou para a família e amigos de casos de tortura e de desaparecidos da ditadura. Encontrou desinformação e desconfiança.

    “Eu contava e ninguém acreditava, diziam que era imaginação. Até meu marido acreditava meio desconfiado”, relembra às vésperas de fazer 90 anos: “Tomei conhecimento das coisas horríveis que se passavam nas prisões, das barbaridades. Mas a classe média é meio protegida das desgraças da sociedade”.

    Em seu apartamento em São Paulo, onde mora só, ela recorda que a comissão “era um dos poucos lugares que apoiavam os perseguidos. Eu recebia pessoas que estavam desesperadas, muitas tinham saído de prisões e estavam profundamente marcadas por aquilo tudo. É horrível perder um pai, um irmão que desapareceu feito fumaça no ar”.

    (…)

    Margarida trabalhou com Arns por 25 anos, presidindo a comissão por três vezes. “O bem que d. Paulo fez não é bastante reconhecido. Quem trabalha com ele cresce.”

    Os criadores da Comissão Arns, inspirados, assim, em Dom Paulo, em Margarida e na Comissão de Justiça e Paz, entendem que os direitos consolidados na Constituição de 1988 sofrem sérios riscos de retrocesso. Eles, no entanto, vão além dos direitos reconhecidos na lei: sabem que há, na sociedade brasileira, “uma dívida histórica quanto à incorporação dos direitos humanos na vida dos cidadãos”. Acrescentam que:

    O objetivo da iniciativa é dar visibilidade e acolhimento institucional a graves violações da integridade física, da liberdade e da dignidade humana, especialmente as cometidas por agentes do Estado contra pessoas e populações discriminadas – como negros, indígenas, quilombolas, pessoas LGBTs, mulheres, jovens, comunidades urbanas ou rurais em situação de extrema pobreza.

    Os 20 membros-fundadores da Comissão Arns, sob a presidência de honra de Margarida Genevois, reúnem seis ex-ministros:
    Claudia Costin, José Carlos Dias, José Gregori, Luiz Carlos Bresser-Pereira, Paulo Sérgio Pinheiro e Paulo Vannuchi; o ex-secretário de Justiça de São Paulo, Belisário Santos Jr.; o advogado e reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, José Vicente; os juristas Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, Fábio Konder Comparato e Oscar Vilhena Vieira; os cientistas políticos André Singer, Luis Felipe de Alencastro, Maria Hermínia Tavares de Almeida e Maria Victoria Benevides; os filósofos Sueli Carneiro e Vladimir Safatle; o líder indígena e ambientalista Ailton Krenak; a jornalista Laura Greenhalgh.

    Os membros fundadores da Comissão Arns divulgarão manifesto, chamando a atenção da sociedade brasileira para o ambiente onde crescem o discurso do ódio, a intolerância, o preconceito e a discriminação.

    O lançamento oficial da Comissão Arns será no próximo dia 20 de fevereiro (quarta-feira), às 11 h, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, no Largo de São Francisco.

     

  • Generais de Bolsonaro revelam plano para calar Igreja Católica

    O Jornal Brasil de Fato repercutiu hoje matéria do Estadão revelando plano, nada secreto do governo, para vigiar a preparação do Sínodo para a Amazônia, promovida pela REPAM – Rede Eclesial Pan-Amazônica, que inclui as Igrejas católicas dos diversos países da região. As atividades preparatórias seguem até outubro de 2019, quando os bispos se reunirão em Roma. O Sínodo foi convocado pelo papa Francisco e é ele quem assina o documento preparatório. O episódio revela mais uma vez o alto grau de desinformação do atual governo. Segue a matéria de Pedro Ribeiro Nogueira, Brasil de Fato, 10 de Fevereiro de 2019.

    “Queremos neutralizar isso aí”: generais de Bolsonaro agem para calar Igreja Católica

    Setores de Inteligência querem silenciar setores progressistas do clero que irão participar do Sínodo para Amazônia no Vaticano.

    Em outubro, cardeais e bispos da Igreja Católica se reunirão no Vaticano para discutir a situação da floresta amazônica. O evento, chamado de Sínodo, é um encontro do clero que irá debater a realidade de índios, ribeirinhos e povos da floresta, além de políticas de desenvolvimento da região, mudanças climáticas e conflitos agrário. A existência dessa conferência motivou preocupação do governo, que vê as pautas como “agenda da esquerda”.

    Reportagem do Estado de S. Paulo, divulgada neste domingo (10), mostra que o governo encara com preocupação a atuação da Conferência Nacional dos Bispos (CNBB) e dos órgão associados, como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e as pastorais Carcerária e da Terra.

    A reportagem traz declarações de Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que afirma que o governo está preocupado. “Queremos neutralizar isso aí”, declarou o responsável pela contraofensiva.

    Para tentar conter as possíveis denúncias da Igreja, o governo solicitou participar do Sínodo, o que é pouco ortodoxo. Lideranças católicas dizem que governos não costumam participar dessas conferências, que terão a participação do Papa Francisco, visto como “comunista” pelo governo Bolsonaro.

    Além disso, escritório da Abin em Manaus (AM), Belém e Marabá (PA), além de Boa Vista (RR), responsável pelo monitoramento de estrangeiros em  Raposa Terra do Sol e terras ianomâmi, serão direcionados para monitorar, em paróquias e dioceses, as reuniões preparatórias para o Sínodo. O governo também irá se aliar a governadores, prefeitos e autoridades eclesiásticas próximas aos quartéis, para tentar diminuir o alcance da conferência.

    Um militar da equipe de Bolsonaro afirmou à reportagem do Estado, em condição de anonimato, que o Sínodo vai contra toda a política de Bolsonaro para região e deverá “recrudescer o discurso ideológico da esquerda”.

    “O trabalho do governo de neutralizar impactos do encontro vai apenas fortalecer a soberania brasileira e impedir que interesses estranhos acabem prevalecendo na Amazônia. A questão vai ser objeto de estudo cuidadoso pelo GSI. Vamos entrar a fundo nisso”, declarou Heleno.

    O evento, batizado de  “Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral”, terá como diretrizes: “Ver” o clamor dos povos amazônicos; “Discernir” o Evangelho na floresta. O grito dos índios é semelhante ao grito do povo de Deus no Egito; e “Agir” para a defesa de uma Igreja com “rosto amazônico”, e deverá ser atendido por 250 bispos.

    “Se os bispos fazem crítica é querendo ajudar, não derrubar. Eles sabem onde o sapato aperta. Vão falar da situação dos povos e do bioma ameaçado. Mas não para atacar frontalmente o governo”, disse D. Erwin Kräutler, Bispo Emérito do Xingu (PA).

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