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Ariovaldo Ramos: O que falta para a fé proclamada por cada religião ser praticada de fato?

CONIC – ação global de solidariedade para proteger a Amazônia e seus habitantes

O que falta para a fé proclamada por cada religião ser praticada de fato?

Religiões têm conteúdo para defender a paz e a igualdade, mas frente aos imperativos do capital o discurso religioso torna-se mera retórica. Enquanto isso, o meio ambiente aguarda por ações concretas de preservação.

Por Ariovaldo Ramos | para a RBA, redebrasilatual,  30/04/2022

Segue o artigo

Esses dias participei de uma reunião entre religiosos; é sempre bastante educativo e interessante. A marca constante é que todos falam bem da sua religião, que é boa, pela paz, vida e progresso de tudo e de todos, e que amam o planeta.

É um momento interessante, porque a gente conta um do outro e conhecer é importante, porque quanto mais a gente conhece o outro mais força tem contra quaisquer preconceitos.

Entretanto, apesar de todas as religiões serem boas, e de todo mundo ser pela paz e pela vida, nós estamos em guerra.

Guerra militar, econômica, social, religiosa. E os operadores desta guerra são todos religiosos, de um jeito ou de outro. Qualquer colocação sobre Deus é religiosa: dizer Deus existe é religioso, dizer Deus não existe também é.

Tudo exige a construção de ética. Contudo, isso não tem sido suficiente: as guerras estão aí, os genocídios estão aí.

No Brasil estamos assistindo ao genocídio dos povos da floresta e a um genocídio pela destruição dos biomas.

Estamos assistindo a uma guerra econômica, onde os trabalhadores perderam seus direitos, sua aposentadoria, sua seguridade. Os salários foram reduzidos, o trabalho foi precarizado, muito próximo do análogo à escravização.

Estão todos sendo empobrecidos, expulsos da suas casas e indo morar na rua, e o Estado é absolutamente inoperante porque a guerra também é política, e a maioria dos estados brasileiros está na mão do capital, de uma maneira ou de outra, mesmo aqueles que dizem que não. Sem contar a ascensão do neonazismo.

E continuamos religiosos. Tem sido assim na história do mundo, tem sido assim história brasileira, nós vivemos quatro séculos de escravização sob o manto da religião.

A pergunta é: por que, se é verdade que as religiões são todas pela paz, pela vida, pela convivência pacífica e respeitosa, pelo direito de culto e de expressão, não concretizamos, na história, o que cremos, a despeito de todas as mudanças que fomentamos?

No Brasil, as três festas sagradas, das três grandes religiões monoteístas coincidiram em termos de calendário: os cristãos celebraram a Páscoa; o judeus, a Passagem; e os muçulmanos, o Ramadã.

Essa coincidência nos desafia a repensar o diálogo religioso, o que fizemos nessa reunião de que participei.

Mas, parece que algo falta: nossas religiões têm o conteúdo necessário para priorizar a paz e a igualdade, contudo, parece que a fé proclamada não é praticada, talvez, porque os senhores do capital também se impõem às lideranças religiosas, e acabam transformando todo discurso religioso numa retórica que os preserva.

Necessitamos de um movimento à altura da relevância da fé e da religião.

Insisto que, juntos, deveríamos trabalhar para que a Constituição brasileira acolhesse o reconhecimento do direito da criação, do direito da natureza, transformando os nossos biomas em sujeitos de direito, determinando defensores desses sujeitos de direito frente ao Judiciário, de modo que, em nome dos biomas, ações pudessem ser levadas ao Judiciário, o que faria com que a luta pela preservação do meio ambiente e contra o genocídio dos povos tradicionais não contasse apenas com a “boa vontade” do executivo ou com anuência do legislativo, mas, também, com ação do Judiciário.

Alguém dirá que existem leis… Sim, só que essas leis precisam ser cumpridas pelo Executivo e não o são.

E não se tem como entrar no judiciário em nome da criação, da natureza.

Há nações indo por esse caminho. Acabei de saber que o Chile, na sua Constituinte, está admitindo o direito da natureza, assim como a Colômbia, que transformou o rio Atrato, que corre na Cordilheira dos Andes, em sujeito de direito para evitar a sua a poluição e destruição.

E se fosse militância comum às religiões instar o legislativo a consagrar tal direito?

Daríamos um exemplo extremamente positivo acerca da importância da religião como consciência da sociedade.

 

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