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É hora de falar sobre eficiência energética
Artigo publicado originalmente em Jornal do Brasil - 28/08/2018
Clauber Leite, pesquisador em Energia do Idec*
Quando o assunto é eficiência energética, o Brasil anda devagar como uma tartaruga. Acabam de ser publicadas as Portarias interministeriais que aprovam os novos índices mínimos exigidos para eletrodomésticos, entre eles o ar-condicionado e refrigeradores. Mas além de pouco ambiciosa, a medida chega com dois anos de atraso – as Portarias 323/2011 e 326/2011 previam que isso acontecesse em 2016. O passo lento não é gratuito: o governo brasileiro tem preferência por investimentos em mais geração.
O ideal – por razões econômicas e ambientais – é adotar índices que façam os equipamentos consumirem menos eletricidade para obter o mesmo serviço, o que seria um grande ganho para o consumidor. Quem pode ser contra isso? Além disso, a indústria que fabrica esses equipamentos é global. As principais marcas vendidas aqui são multinacionais e oferecem equipamentos bem mais eficientes em China, Índia e Vietnã, além de Europa, Japão, Coreia do Sul e EUA.
Hoje, as geladeiras são responsáveis por cerca de 30% do consumo doméstico e o ar-condicionado é o segundo item de maior consumo nos setores residencial e comercial. Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) do Ministério de Minas e Energia, o consumo de energia dos principais equipamentos residenciais crescerá por conta de seu acesso mais facilitado às famílias – em especial o ar-condicionado, que responderá sozinho por mais de 18% do consumo elétrico domiciliar em 2024. Esse eletrodoméstico também causa picos de demanda, forçando o acionamento das dispendiosas termelétricas. Projeções da Agência Internacional de Energia (IEA) mostram que o aparelho será responsável por 31% do pico de carga em 2050.
Com a energia cada dia mais cara, é urgente a oferta de equipamentos mais eficientes. Na China, na Coreia do Sul, no Japão e nos EUA o aumento de eficiência energética dos condicionadores de ar é política pública, com metas. Visa não só atacar os efeitos do alto consumo, como também promover a inovação e contribuir para o crescimento da própria indústria. As empresas se planejam para alcançar e, em alguns casos, superar essas metas preestabelecidas. Os resultados têm sido queda dos custos de produção, aumento contínuo da eficiência e ganhos ambientais.
No ranking da eficiência energética, o Brasil pega o vigésimo lugar entre os 25 países que mais consomem energia no mundo. Itália e Alemanha empatam em primeiro lugar, com 75,5 pontos de 100 possíveis, seguidos por França, Reino Unido e Japão. Os dados são da 4ª edição do International Energy Efficiency Scorecard, do American Council for an Energy-Efficient Economy (ACEEE), que dá uma pista de por que estamos tão atrás na fila: a Alemanha investe mais de US$ 2,5 bilhões por ano em eficiência energética (US$ 31 per capita) e a Itália, mais de US$ 1,5 bilhão (US$ 25). O Brasil destina ao setor apenas US$ 191 milhões (US$ 0,94).
O Lawrence Berkeley National Lab, do Departamento de Energia dos EUA, estimou que, no Brasil, uma melhoria de 30% nos índices de eficiência energética significaria a redução de 23% das emissões de gases do efeito estufa pelo setor até 2050. Seria uma contribuição significativa no cumprimento das metas que o país se comprometeu no Acordo de Paris. Isso, com tecnologias que já estão disponíveis comercialmente.
O constante aumento de tarifas, as bandeiras tarifárias e a sucessiva intensificação da participação de encargos e subsídios, faz com se questione a razão de o porquê não adotar um aperfeiçoamento tecnológico ao longo da cadeia para que se reduza a demanda por energia. Pouco se tem feito para a redução da demanda e praticamente todo o planejamento é feito para a expansão da oferta, o que invariavelmente acarreta em aumento de custo para o consumidor. Os impactos do avanço da eficiência energética para os refrigeradores e condicionadores de ar é um pequeno passo na direção correta, que pode colocar o Brasil em outro patamar, onde todos saiam ganhando – indústria, consumidor e meio ambiente. É preciso ter armas eficientes contra as forças do atraso.
*Artigo publicado originalmente em Jornal do Brasil
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