Iser Assessoria

Que democracia é esta?

Esta eleição presidencial será a oitava depois do fim da ditadura civil-militar de 1964-1985. Em todas as eleições anteriores, houve disputas mais ou menos acirradas, houve denúncias de uns candidatos contra outros, houve debates, duros às vezes. Porém, os candidatos se consideravam parte de um processo democrático, onde tanto poderiam ganhar como perder, em que os outros candidatos, ou – no caso do segundo turno – o outro candidato era um adversário político.

Esta é a primeira eleição em que um dos dois candidatos considera o outro candidato um inimigo: que, após o voto popular, se for eleito, mandará prender o outro candidato. Ele também considera que o partido do outro candidato (o PT) não tem direito à existência: ele não admite oposição. Os opositores vão ser “varridos”: “vai ser a maior faxina da história do Brasil”. Eles só têm dois direitos: ao exílio ou à prisão. E, se resistirem, terão o que merecem: “no lombo de vocês”.

O regime político inaugurado por sua eleição será um regime no qual só haverá um lado: seus eleitores e seus apoiadores. Não há liberdade para a contestação. Havia, até a eleição: após a eleição, não haverá mais. Ele disse explicitamente que vai acabar com os “ativismos” no país e, além disso, vai acabar com as ONGs (organizações não governamentais), isto é, toda forma de associação para defender direitos e fazer reivindicações. Em outras palavras, não haverá mais liberdade de organização, de manifestação e de protesto.

Ele afirmou que apóia a imprensa livre, “mas somente a imprensa responsável”, não aquela que publica o que ele não quer, não aquela que investiga suas ações, que monitora suas iniciativas. A que publica o que ele não quer não terá direito à existência.

Em outras palavras, a tão temida “ditadura bolivariana” que o PT criaria, se ganhasse as eleições, vai ser instalada por ele mesmo, Bolsonaro: uma sociedade onde só ele e os seus terão direitos, os demais terão que se mudar (“Brasil, ame-o ou deixe-o”, slogan da ditadura) ou aceitar a prisão.

Os que não se conformarem ou ousarem discordar serão vítimas de seus apoiadores que, desde já, estão liberados para praticar atos violentos contra os insubmissos: surra, pauladas, barras de ferro, eventualmente facadas. Já houve mais de 70 agressões registradas contra eleitores de Fernando Haddad ou pessoas LGBTI: os discursos do candidato Bolsonaro servem como incentivo e licença para o exercício da violência. Nas palavras dos agressores, não se render à liderança do ex-capitão é motivo para a pessoa sofrer consequências – apanhando, sofrendo xingamentos, humilhações – para aprender “qual é o seu lugar”.

Estas eleições não estão ocorrendo em condições democráticas: os eleitores de Haddad ou aqueles que discordam de Bolsonaro não têm liberdade para fazer campanha, para expor suas ideias, defender suas propostas. Se o fazem, correm o risco de ser agredidos. Pior: as instituições públicas que deveriam defender os direitos dos cidadãos não estão tomando as providências cabíveis. Nem o TSE nem o STF estão agindo à altura do que o momento exige: a campanha de Bolsonaro deveria ser denunciada e sofrer sanções pesadas pelo que fez e pelas falsidades que divulgou.

Todo o processo está viciado: no caso do Brasil, não são as urnas que estão fraudadas, a fonte da fraude é a campanha. Os candidatos não estão em pé de igualdade: há enormes facilidades e espaço para um, que ameaça sempre com o uso da violência, e fortes restrições para aquele que respeita o processo democrático.

Vamos ser bem explícitos: o candidato Jair Bolsonaro não tem condições de se apresentar para disputar a presidência do Brasil. O discurso que ele proferiu para seus apoiadores no último domingo foi de extrema clareza. Segundo a nossa Constituição, uma pessoa que não aceita o regime democrático, que não se compromete com o direito à liberdade de todos/as os/as cidadãos/ãs, com o respeito aos adversários políticos, que não respeita a liberdade de imprensa, que não se dispõe a respeitar a liberdade de organização, de expressão, de manifestação, da sociedade civil, esta pessoa não tem condições de disputar a presidência do país.

Porque nós ainda somos uma democracia. E a democracia tem regras.

 

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