Artigo

  • Solidariedade à pastora Romi Bencke e ao CONIC

     

    Vimos a público manifestar nossa solidariedade à pastora luterana Romi Bencke e ao CONIC, que vêm sendo difamados nas redes sociais por grupos neoconservadores católicos. Nos últimos dias, fomos surpreendidos por vídeos em que a pastora Romi e o CONIC foram atacados por seu papel na concepção da Campanha da Fraternidade ecumênica deste ano, cujo lema é justamente a promoção do diálogo (“Fraternidade e diálogo: Compromisso de Amor”).

    A Campanha da Fraternidade ocorre no cerne da Igreja Católica do Brasil há mais de 50 anos e, a cada cinco anos, é elaborada pelo CONIC. Neste ano, foi pensada por um grupo de oito representantes de igrejas e movimentos cristãos brasileiros, entre eles: Igreja Católica Apostólica Romana, por meio da CNBB; Aliança de Batistas no Brasil; Igreja Episcopal Anglicana; Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil; Presbiteriana Unida; Sirian Ortodoxa de Antioquia; Igreja Betesda (igreja convidada); e CESEEP, organismo ecumênico.
    A campanha tem como objetivos: denunciar as violências contra pessoas, povos e a Criação, em especial, as violências cometidas em nome de Jesus; encorajar a justiça para a restauração da dignidade das pessoas, para a superação de conflitos e para alcançar a reconciliação social; animar o engajamento em ações concretas de amor à pessoa próxima; promover a conversão para a cultura do amor em lugar da cultura do ódio; e fortalecer e celebrar a convivência ecumênica e inter-religiosa. A campanha repudia o racismo, a misoginia e outras formas de violência que aprofundam a cultura de ódio, e, por isso, vem sendo chamada de “revolucionária” por seus detratores.

    O CONIC, que nasceu em 1982, em Porto Alegre, é um órgão que congrega igrejas cristãs de várias denominações. Um dos seus principais objetivos é fomentar um diálogo ecumênico que favoreça uma interlocução com organizações da sociedade civil e governo em prol de políticas públicas que viabilizem a paz e a justiça. O CONIC também possui forte atuação na defesa do Estado laico, entendendo que só um Estado que respeite a pluralidade e a diversidade religiosa é capaz de promover a paz em seu território.

    A pastora Romi Bencke, secretária-geral do CONIC, é a primeira mulher a assumir esse cargo no Brasil. Sua trajetória e seu serviço pastoral culminam nos valores que cremos e defendemos: a promoção do diálogo ecumênico/religioso e a defesa dos Direitos Humanos.

    Os grupos e organizações da sociedade civil que assinam essa nota atestam o compromisso da pastora Romi e do CONIC com os valores da paz, da justiça, do diálogo e do respeito às diversas crenças, e repudiam qualquer tipo de violência e difamação contra a pastora, os coordenadores da Campanha da Fraternidade, ou a Campanha em si.

    ABONG
    Católicas pelo Direito de Decidir
    Conectas Direitos Humanos
    Iser Asssessoria

    Para assinar:
    https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSdqcutzz2tpRugSTeXEp7F0sn2CFbPKRlNSFXCF0PLyda7RPA/viewform

    Para ver quem já assinou: https://www.cartacapital.com.br/blogs/dialogos-da-fe/solidariedade-a-pastora-romi-bencke-e-ao-conic/

     

  • Dom Evaristo Spengler – O Tráfico de Pessoas é uma chaga aberta em uma sociedade sem empatia

    08 de fevereiro – Dia Internacional de Oração e Reflexão contra o Tráfico de Pessoas

    Dom Evaristo é Presidente da Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano

    Dom Evaristo Spengler comenta data contra o Tráfico de Pessoas

    Dom Evaristo Spengler, presidente da Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano (CEPEETH) da CNBB

    Dom Evaristo Spengler / Foto: Franciscanos

    Nesta segunda-feira, 8, celebra-se o Dia Internacional de Oração e Reflexão contra o Tráfico de Pessoas. O Papa Francisco, em uma mensagem em vídeo, reforçou o caráter desta data junto à sociedade contemporânea: dar um fim a este crime e promover uma economia que não use as pessoas com fins mercadológicos.

    “O tráfico de pessoas é uma chaga aberta em uma sociedade sem empatia, que deixa o lucro nortear todas as suas ações”, critica Dom Evaristo Pascoal Spengler, que responde pela Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). “Nessa visão de mundo, movida pelo lucro, o ser humano é um mero objeto, do qual pessoas ou grupos podem se apropriar para gerar lucro”, reitera.

    A Igreja, segundo Dom Evaristo, sempre se postou veementemente contra este fenômeno. No entanto, de acordo com o religioso, foi em 2008 que a CNBB, após um seminário em caráter nacional, com a participação dos Regionais de todo o país, resolveu articular esta luta de maneira mais organizada. “Em 2009, avançou-se com a criação de um Grupo de Trabalho (GT) específico para articular o enfrentamento ao tráfico de pessoas. Um dos grandes frutos do trabalho desse GT foi a Campanha da Fraternidade de 2014 com o tema ‘Fraternidade e Tráfico Humano’, que despertou a Igreja do Brasil a abraçar essa causa. Em 2016, deu-se um novo passo com a criação da Comissão Episcopal Pastoral para o Enfrentamento ao Tráfico Humano”, explicou.

    Os aliados da Igreja

    São diversos grupos dentro da Igreja que trabalham para pôr fim ao tráfico humano. Existe a Rede ‘Um Grito Pela Vida’, da Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), a Cáritas Brasileira, O serviço Pastoral do Migrante, o Setor da Mobilidade Humana da CNBB entre outros.

    “É importante frisar que a Igreja não faz o combate ao tráfico, isso pertence às forças de segurança do Estado. O trabalho do Estado compreende a prevenção, a repressão e a punição. A Igreja faz o enfrentamento. As principais ações da Igreja, nesse sentido, são a articulação com as diversas forças da sociedade; a capacitação de lideranças para atuarem no enfrentamento ao tráfico de pessoas; e atuar na prevenção, na incidência política e na denúncia. Muitos grupos da Igreja Católica fazem um belíssimo trabalho de acompanhamento às vítimas do tráfico”, advertiu Dom Evaristo.

    Além desses esforços, a CNBB publicou um manual, “Orientações Pastorais sobre o Tráfico de Pessoas”, no qual disseca todo o assunto e o posicionamento cristão nesta batalha contra o tráfico humano. “Convido a todos os cristãos que ainda não sabem como se engajar na luta contra o tráfico de pessoas a conhecerem esse texto. Ele ilumina a ação pastoral da Igreja que se posiciona a favor da liberdade e da vida, com preciosas orientações práticas que podem ser aproveitadas pelos diversos grupos pastorais”, disse Dom Evaristo.

    Mais igualdade social

    Os órgãos internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU) e mesmo a Igreja reconhecem que a desigualdade social é um dos principais fatores que propiciam o tráfico humano. “Com certeza, o alvo preferencial dos traficantes são os mais vulneráveis, entre eles migrantes e pessoas desempregadas”, alerta o religioso. “Sem dúvida, um país e um mundo com maior justiça social, com menos desigualdades, com pessoas estabilizadas, com direito a estudo, trabalho, moradia e renda, faria diminuir esse problema”, reitera.

    Dom Evaristo, porém, afirma que a raiz deste mal é uma só: a busca pelo lucro exacerbado. “Enquanto o mundo deixar-se guiar pelo princípio do lucro e considerar a pessoa humana pelo que possui, sempre haverá aliciadores prometendo vida fácil, riqueza e fama a vítimas inocentes que confiam cegamente em promessas enganadoras. É tempo de a humanidade doente pelo lucro deixar-se curar pela fraternidade e pela solidariedade”, pondera.

    O tráfico humano durante a pandemia

    Ainda não há dados certos a respeito, mas é provável que a pandemia pode ter piorado o tráfico humano. “Ainda não temos os números finais do ano 2020, mas estudos preliminares apontam que com a pandemia do Coronavírus, ao invés de diminuir, aumentou a situação do tráfico no Brasil e no mundo”, lamenta Dom Evaristo. “Muitos países entraram em recessão, milhares de pessoas no mundo estão sem trabalho, fora da escola e sem apoio social. Isso é um indicador de que a situação do tráfico venha piorar ainda mais”.

    O presidente da Comissão Contra o Tráfico assegura que os cuidados da Igreja, especialmente nestes dias pandêmicos, foram redobrados. “A Igreja no Brasil está sendo incansável, durante a pandemia, em apoiar grupos vulneráveis, especialmente contribuindo na segurança alimentar. Contudo é visível em todo o país o aumento da fome, da exploração do trabalho infantil e da exploração sexual. Esses crimes estão naturalizados em nossa sociedade. Fechar os olhos para essa realidade é fechar os olhos para o tráfico humano que decorre deles e persiste como uma atividade crescente e invisível em nosso meio”, finaliza.

    Fonte: Thiago Coutinho para notícias.cancaonova – 8 de fevereiro de 2021.

  • CARTA DO MST AO POVO BRASILEIRO:
    Por mudanças urgentes! Em defesa da vida e da esperança!


    MST aponta lutas para próximo período em defesa da vida e dos direitos do povo brasileiro. Para isso, fora Bolsonaro é urgente e necessário

    Ancoradas e ancorados pela mística rebelde e cultivada com a cultura camponesa, a Coordenação Nacional do MST, no marco dos nossos 37 anos, reuniu-se de forma remota no período de 28 a 30 de janeiro de 2021, contando com cerca de 1000 delegadas e delegados de todo país, com o objetivo de analisar a conjuntura nacional, internacional, nos aprofundar no estudo da questão agrária, projetar a Resistência Ativa e a construção permanente da Reforma Agrária Popular.

    “Sonhamos para além de nós próprios” e dedicamos a nossa formulação e disposição de luta em solidariedade aos familiares das 222.666 pessoas mortas (oficialmente) na pandemia no Brasil. Entendemos, que essas mortes não são apenas causadas pelo vírus, mas é resultado da lógica de um mundo regido pelo neoliberalismo, onde o lucro está acima da vida. E, em meio a corpos em gritos de asfixia, cerca de 2 mil bilionários aumentaram suas fortunas para 12 trilhões de dólares. Apenas com o lucro, em 2020, das dez pessoas mais ricas no mundo, seria possível comprar vacina para toda população mundial.

    Mas, para os povos, a crise do capitalismo tem se agravado. E tem cobrado em destruição da natureza, em empregos e renda, e sobretudo em vidas humanas!  No Brasil, esse cenário se aprofunda sob o comando do governo Bolsonaro, que tem a pior gestão da pandemia no mundo. Chegamos a um cenário onde dos 100 milhões de brasileiros economicamente ativos, 14 milhões estão desempregados, 6 milhões desalentados e 40 milhões de pessoas vivem de “bicos”. São 60 milhões de brasileiros e brasileiras abandonados pelo Estado, expostos à violência e à fome, agravada pelo fim do auxílio emergencial e pela alta no preço dos alimentos. Volta Auxílio Emergencial!!

    A vacinação não está garantida para todos. E isso não é só incompetência, é projeto de morte, de quem despreza a vida do povo brasileiro! A situação de Manaus e de outros estados, sem oxigênio, sem médicos e insumos, é um crime de Estado. Queremos respirar! Vacinação já!! Para todos e todas, gratuita e garantida pelo SUS! Portanto é urgente a revogação da Emenda Constitucional 95, que impôs cortes para a saúde pública e a educação.

    Contudo, sabemos que não será garantido pelo projeto de morte, e o povo brasileiro tem se manifestado em resistência. Já são 66 pedidos de impeachment protocolados no Congresso. Exigimos que o presidente da Câmara respeite a vontade popular e coloque o Impeachment em votação. Jamais esqueceremos os nomes de todas as autoridades que silenciam ou colaboram com o assassino que está no poder. Estamos atentos e exigimos a restituição dos direitos políticos de Lula. E não recuaremos diante das ameaças de rompimento com a democracia.

    O Fora Bolsonaro é urgente e necessário! Não podemos esperar! Chegou a vez do povo! 2021 trouxe um novo clima político protagonizado pelas forças populares e de esquerda, reunidas pela Frente Brasil Popular e Povo Sem Medo, demonstrando que é possível combinar cuidados sanitários com ações simbólicas. Daqui pra frente, não daremos trégua, voltaremos às ruas com nossos carros, bicicletas, carroças e muita indignação. Seguiremos em luta no mês de fevereiro e em março seremos tomados pelos aromas das lutas do 8 de março.

    Portanto, convocamos toda a classe trabalhadora a construir as bandeiras de lutas:
    A luta pela Vacinação Já!  Volta Auxílio Emergencial!  Fora Bolsonaro!

    Exigimos a derrubada dos vetos presidenciais ao auxílio aos povos do campo!
    Denunciarmos que a volta às aulas é crime. Aulas se recuperam, vidas não!
    Defender o SUS e revogar a Emenda Constitucional 95!

    Nesse sentido, nos comprometemos em organizar o Fora Bolsonaro em todos os municípios que temos acampamentos e assentamentos, dialogando com o povo e defendendo a vida, produzindo alimentos saudáveis para amenizar os efeitos da crise junto ao povo, como 4 milhões de quilos de alimentos doados em 2020.

    Seguiremos inspirados no exemplo de Paulo Freire em seu centenário e seguiremos firmes com o seu legado, produzindo alimentos saudáveis, plantando árvores, fazendo formação política, organizando nossa Jornada de Formação e Trabalho de Base e contribuindo com as ações de solidariedade nas periferias urbanas junto com outros movimentos populares e parceiros da nossa luta.

    Reafirmamos a nossa solidariedade com todos os povos em luta no mundo e que estão resistindo à políticas de neocolonialismo, do imperialismo e de aumento da exclusão e da migração forçada. Nos solidarizamos com os povos do campo, das águas e das florestas em luta! Nos somamos à luta contra o racismo, contra a LGBTfobia e contra o patriarcalismo em todo mundo! Prestamos nossa solidariedade aos camponeses e camponesas da Índia que estão em luta há diversas semanas.

    Seguimos na Resistência Ativa, nos nossos territórios enfrentando as políticas de desmonte da reforma agrária e as tentativas de privatização das terras, contra a entrega de 25% de cada município para o capital estrangeiro, a regularização da grilagem e a apropriação dos bens naturais. Denunciamos o modelo do agronegócio e da mineração como grandes culpados da eclosão das pandemias, por seu modelo de destruição das florestas e da biodiversidade, e da produção animal em escala industrial. “Porque lutar para nós é fazer aquilo que o povo quer ver realizado”.

    Seguiremos nos articulando no Brasil e em nível internacional com todas as forças sociais e populares que querem construir uma sociedade baseada na solidariedade, na igualdade e na justiça social. Uma sociedade socialista!

    Vamos à luta com nossas bandeiras!
    Lutar, Construir Reforma Agrária Popular!

  • A centralidade da pessoa na Economia de Francisco

    Artigo de Fabio Antunes do Nascimento para IHU   27 Janeiro 2021

    O presente trabalho procura reunir elementos acentuados no Magistério do Papa Francisco, em suas intervenções em relação a economia, a política, ao trabalho e aos seres humanos. Consideramos relevante demonstrar como Papa Francisco tem se destacado como líder mundial na perspectiva propositiva, pois em várias áreas científicas temos expoentes que elaboram diagnósticos da realidade econômica mundial, assim como que caracterizam um quadro sempre mais agudo das desigualdades, da pobreza e da exclusão. Contudo, poucos sinalizam propostas alternativas para o modelo vigente, como, por exemplo, as propostas do Papa Francisco que superam o âmbito da Igreja e inspiram toda a humanidade.

    Ao relacionar alguns elementos da economia mundial, a realidade do trabalho e a maneira como a política tem se orientado para o capital, caracterizamos a emergência de repensar a economia, trazendo o ser humano para o centro, como sugere Francisco: dar uma alma para a economia. De modo que esse movimento consistiria em novas relações, novas preocupações e novos valores, nos quais a vida das pessoas e a do planeta são prioridades.

    O presente trabalho quer ajudar a difundir os impulsos inovadores de Francisco, que sonha com a fraternidade universal, com o protagonismo dos jovens, com uma Igreja pobre com e para os pobres e com uma economia a serviço da vida. Daí a iniciativa do encontro em Assis com os jovens do mundo todo:

    É por isso que desejo encontrar-me convosco em Assis: para promover juntos, através de um “pacto” comum, um processo de mudança global que veja em comunhão de intenções não apenas quantos têm o dom da fé, mas todos os homens de boa vontade, para além das diferenças de credo e de nacionalidade, unidos por um ideal de fraternidade atento, acima de tudo, aos pobres e aos excluídos. Convido cada um de vós a ser protagonista deste pacto, assumindo um compromisso individual e coletivo para cultivarmos juntos o sinal de um novo humanismo que corresponda às expectativas do homem e ao desígnio de Deus (Francisco, 2020).

    O lugar do ser humano na economia e no mundo do trabalho

    As mazelas dos sistemas econômicos vigentes no mundo são temas de intermináveis reflexões, bem como, suas origens, seus desenvolvimentos e, de forma especial, suas consequências. Não é a intencionalidade do presente trabalho assomar-se a essa reflexão, já desenvolvida de forma aprofundada e científica por vários teóricos. A intenção é contribuir na difusão do sonho do Papa Francisco de uma nova economia mundial. Trata-se de um sonho, porque mais do que uma teoria, um projeto ou um conjunto de conceitos pré-concebidos, a “Economia de Francisco” [1]é um chamado a toda a humanidade.

    A iniciativa do Papa Francisco não tem um ponto de chegada, mas tem um caminho escolhido: o caminho da inclusão de todos, dos valores da vida e do meio ambiente. Por isso, o convite do Papa para repensar a economia reflete diretamente nas relações de trabalho, ao passo que é, justamente, nesse contexto que devem ser tratadas, bem como assumidas as novidades que têm transformado positivamente o mundo do trabalho. Nesse intuito a abordagem é teológica pastoral do serviço da Igreja no mundo, como serva, luz dos povos.

    Os números sobre o modelo econômico mundial mostram que o abismo entre ricos e pobres é cada vez maior. No Brasil, por exemplo, 06 famílias concentram mais riqueza que a metade da população do país, enquanto que, no mundo 26 famílias concentram mais riquezas que a metade da população mundial mais pobre. Estudiosos como Thomas Piketty [2], demonstram em suas publicações como as grandes fortunas se mantiveram nas mãos de algumas famílias nos últimos séculos e como os que detêm o capital ficam cada vez mais ricos, especialmente, nesse período da pandemia [3]. O desenvolvimento industrial, tecnológico e científico alardeados como motores da superação da desigualdade econômica não cumpriram suas promessas:

    Há regras econômicas que foram eficazes para o crescimento, mas não de igual modo para o desenvolvimento humano integral. Aumentou a riqueza, mas sem equidade, e assim “nascem novas pobrezas”. Quando dizem que o mundo moderno reduziu a pobreza, fazem-no medindo-a com critérios doutros tempos não comparáveis à realidade atual. Pois noutros tempos, por exemplo, não ter acesso à energia elétrica não era considerado um sinal de pobreza nem causava grave incômodo. A pobreza sempre se analisa e compreende no contexto das possibilidades reais dum momento histórico concreto (FRANCISCO 2020, 21).

    era digital tem criado formas de trabalho: umas sofisticadas e rentáveis, que lidam essencialmente com a informação, enquanto que outras são rudimentares e desprovidas de proteção estatal e institucional, por exemplo, os trabalhadores das plataformas de serviços, que conectam consumidores ávidos de produtos, quase que instantâneos, a milhares de trabalhadores que criam uma rede de logística complexa e exigente, desprovidos de proteção legal, com baixíssima remuneração, além de nem considerados trabalhadores formais.

    Segundo Otávio Augusto Cunha, há ainda, um movimento apresentado como empreendedorismo, propagandeado como caminho de oportunidades, que é, na verdade, outro artifício fabricado pelo sistema para potencializar a equação – custo x produção –, diminuindo sempre da parcela de ganho do trabalhador e obtendo lucros maiores. Esse movimento tem colocado mais e mais trabalhadores na informalidade, com o utópico horizonte da riqueza. Porém, estruturalmente, essas ideias vão moldando um modelo de sociedade e de relações que exaltam a competitividade, e a produção, ao mesmo tempo em que alienam no tocante a realidade social e a outras dimensões da vida, como descreve Cunha:

    A exaltação da lógica do empreendedorismo na sociedade atual busca afirmar que, ao exercer essa função, o sujeito está acima das relações das classes sociais. É um discurso perigoso, que se apoia no caráter funcional que esse tipo de exaltação tem para a manutenção da sociedade capitalista e de suas contradições estruturais e irreparáveis. Para os adeptos da solução através do “empreendedorismo”, não importa que se trate de um trabalhador assalariado ou de um capitalista, todos têm que ser educados para exercer a função empreendedora. Para isso, basta ter “força de vontade”, “determinação”, “flexibilidade”, “resiliência”, “proatividade”, “persistência”, “iniciativa” etc. Pois é o sujeito em sua singularidade o único responsável pelo seu sucesso ou o seu fracasso econômico (CUNHA, 2020).

    A propaganda do sistema que gera esses elementos – subempregos e empreendedores– está colapsando, na perspectiva de trabalho e renda para todas as pessoas. A iniciativa da Economia de Francisco, mais do que propor modelos ou programas de renda, apresenta novos princípios. Com efeito, um princípio fundamental é de todos terem acesso a uma renda universal, não como a recompensa por uma tarefa executada, mas por se tratar de um direito básico. Assim, a perspectiva de uma nova economia daria ao trabalho uma nova razão de existir, deixando de ser uma simples engrenagem de manutenção do sistema, para assumir o caráter de direito que a sociedade possibilitaria a todas as pessoas, havendo ou não a remuneração como uma finalidade.

    trabalho é uma engrenagem do sistema econômico, um universo complexo que se move num sentido concêntrico, a semelhança de um buraco negro, que engole tudo ao seu redor. Esse movimento sustenta a pirâmide do capitalismo, no qual ricos tornam-se cada vez mais ricos, sustentados por uma grande base de trabalhadores. É verdade, que a modernidade e as tecnologias trouxeram a impressão de uma certa melhoria nas condições de trabalho, como também, alguns casos, apresentados como símbolos das possibilidades de prosperidade oferecidas no sistema, em que alguns poucos felizardos fazem fortunas, como esportistas, artistas e inventores de APPs.

    Essa revolução anuncia efeitos devastadores sobre o mundo do trabalho, particularmente sobre a estrutura ocupacional. Por ora, percebem-se duas posições em debate: Aqueles que acreditam num final feliz (trabalhadores deslocados pela tecnologia encontrarão novos empregos desencadeados pelas novas tecnologias) e aqueles que veem um processo crescente de destruição de empregos (SANSON, 2020).

    exploração do trabalho não é uma invenção do sistema capitalista. Na história de várias culturas existiram formas de exploração e, até mesmo, de escravidão do trabalho humano. O que acontece no sistema capitalista é que, justamente, a exploração do trabalho como gerador de riqueza é um princípio estruturante do sistema. Especialmente, em nosso tempo se tem percebido que:

    Estão aqui também os autores nacionais como o próprio Ricardo Antunes, Marcio Pochmann, Márcia Paula Leite, Dari Krein, Giovanni AlvesJosé Ricardo RamalhoMarco Aurélio Santana, Roberto Véras, entre outros. Todos eles acentuam a ofensiva do capital frente ao trabalho, manifesta no trinômio flexilibilização, terceirização e precarização chancelada pelo Estado subordinado aos interesses do capital (SANSON, 2017).

    Do modo que se dão as relações de trabalho no mundo vemos uma política orientada para lógica econômica, na qual a geração do lucro para os que detêm o capital é a prioridade. Por sua vez, o Papa Francisco tem exortado a humanidade à superação do paradigma tecnocrático e capitalista:

    Gostaria de insistir que “a política não deve submeter-se à economia, e esta não deve submeter-se aos ditames e ao paradigma eficientista da tecnocracia”. Embora se deva rejeitar o mau uso do poder, a corrupção, a falta de respeito das leis e a ineficiência, “não se pode justificar uma economia sem política, porque seria incapaz de promover outra lógica para governar os vários aspectos da crise atual”. Pelo contrário, “precisamos duma política que pense com visão ampla e leve por diante uma reformulação integral, abrangendo num diálogo interdisciplinar os vários aspectos da crise”. Penso numa “política salutar, capaz de reformar as instituições, coordená-las e dotá-las de bons procedimentos, que permitam superar pressões e inércias viciosas”. Não se pode pedir isto à economia, nem aceitar que ela assuma o poder real do Estado (FRANCISCO, 2020, 177).

    Nessa perspectiva, Papa Francisco convoca o mundo a um pacto por uma nova economia, isto é, uma economia orientada pela política da promoção e do cuidado da vida em todo o planeta. Na concepção do Papa “é necessário fazer crescer não só uma espiritualidade da fraternidade, mas também, e ao mesmo tempo, uma organização mundial mais eficiente para ajudar a resolver os problemas prementes dos abandonados que sofrem e morrem nos países pobres” (FRANCISCO, 2020, 165). A nova economia é uma resposta de fé que encarna o Evangelho nas estruturas sociais do mundo e vê no rosto dos pobres o rosto de Cristo.

    Destarte, no mundo do trabalho vive-se um desencanto porque as promessas da modernidade de que os desenvolvimentos tecnológicos e econômicos trariam o bem estar social para todas as pessoas não se comprovaram. A modernidade sinalizava trabalhos que fossem mais leves e melhores remunerados. Todavia, o que se vive e/ou se assiste na prática é um abismo crescente nas condições de trabalho no mundo. Por um lado, enquanto cresce a realidade do trabalho em tarefas cada vez mais especializadas e técnicas com remunerações exorbitantes, por outro aumenta a precarização dos trabalhos mais elementares, marginalizados e excluídos do sistema, da técnica e da informação, ou seja, elementos básicos da chamada quarta revolução industrial, como aponta a Organização Internacional do Trabalho (OIT):

    No final do século XVIII a primeira revolução industrial marcou a transição da produção manual para a mecanizada com o uso da energia a vapor. A segunda, em meados do século XIX, trouxe a eletricidade e com ela, a manufatura em massa. A terceira ocorreu em meados do século XX com a chegada da eletrônica e da tecnologia da informação. Atualmente a chamada “quarta revolução industrial” é marcada pela automação, robotização e produção das fábricas com grande independência do trabalho humano combinadas com a utilização de serviços através de aplicativos, softwares, plataformas digitais e armazenamentos de dados em massa (OIT, ?, 19).

    O avanço tecnológico e as riquezas produzidas na sociedade não significam necessariamente a superação das desigualdades, em especial ao que se refere a trabalho e renda. “O mundo avançava implacavelmente para uma economia que, utilizando os progressos tecnológicos, procurava reduzir os “custos humanos” (FRANCISCO,2020, 33). A superação do paradigma tecnocrático e do capital exige que a vida de todas as pessoas e de todo o planeta sejam a prioridade para qual se ordena a política e a economia. Construir uma nova ordem econômica é, antes de tudo, garantir a maior riqueza possível: que todos “tenham vida e, vida em abundância” (cf. Jo 10,10).

    mercantilização do trabalho gera o que o marxismo denomina alienação, que não deve ser compreendida na dimensão social e política, mas, em última instância, como alienação humana. Não obstante, no modelo econômico atual a renda é compreendida como uma recompensa pela produção que a pessoa é capaz de gerar, de modo que, o conceito conhecido como o “sonho americano” ilustra a ideia do sistema capitalista no qual todos têm a mesma oportunidade de prosperar, de construir patrimônio e de enriquecer. Mas, na realidade, a simples competição não garante a justiça e a igualdade, pois a competição pelas melhores recompensas nem sempre parte das mesmas condições para todas as pessoas. São muitas as condicionantes que determinam o sucesso econômico de uma seleta quantidade de pessoas e a grande maioria da população que luta pela simples subsistência.

    Nesse sentido, esse modelo, além de valorar de forma muito seletiva o trabalho de uns poucos e depreciar o trabalho da grande maioria dos trabalhadores, é insuficiente para oferecer trabalho para todas as pessoas, já que um dos pressupostos do sistema é a competitividade pelos postos de trabalho e a massa sobrante de trabalhadores, que alimenta a competitividade, e que, sobretudo, assegura a oferta que barateia a mão de obra. Somada a chamada revolução 4.0 o horizonte do trabalho tende a agravar sensivelmente a precarização, e, por conseguinte, os trabalhadores conseguirão cada vez menos ingressar no modelo de trabalho formal. Logo, menos pessoas poderão contar com uma remuneração estável.

    A proposta de Francisco

    O Papa Francisco nesses sete anos de pontificado conquistou um posto de liderança mundial. Num contexto de nações que se aproximaram de regimes de extrema direita, nacionalismospreconceitos, migrações, conflitos violentos e crises sanitárias e econômicas o Papa tem se destacado como o líder capaz de dar voz aos sensatos. Assim, bem mais que reformas eclesiais, Francisco tem protagonizado iniciativas de reformas culturais e políticas em âmbito global, ao passo que e é nesse contexto que se insere o evento “Economia de Francisco” cuja proposta é criar um pacto global, em vista de uma nova economia, como conclamou o Papa:

    Escrevo-vos a fim de vos convidar para uma iniciativa que desejei muito: um evento que me permita encontrar-me com quantos estão a formar-se e começam a estudar e a pôr em prática uma economia diferente, que faz viver e não mata, inclui e não exclui, humaniza e não desumaniza, cuida da criação e não a devasta. Um acontecimento que nos ajude a estar unidos, a conhecer-nos uns aos outros, e que nos leve a estabelecer um “pacto” para mudar a economia atual e atribuir uma alma à economia de amanhã (FRANCISCO, 2020).

    Dar uma alma para a economia é o desejo do Papa ao provocar os jovens do mundo todo a construir um pacto por uma nova economia. Segundo Francisco “é preciso corrigir os modelos de crescimento incapazes de garantir o respeito pelo meio ambiente, o acolhimento da vida, o cuidado da família, e equidade social, a dignidade dos trabalhadores e os direitos das gerações vindouras” (FRANCISCO, 2020). A consciência planetária de Francisco reconhece que o modelo da economia mundial agride esses valores fundamentais. Em sua concepção a economia deve estar a serviço da política que promove a vida e o planeta.

    Igreja, ao longo da história, participou de momentos decisivos da humanidade, tais como, as grandes revoluções e o desenvolvimento cultural, intelectual e político, mesmo que, algumas vezes, essa participação tenha sido de oposição e contestação. Destarte, o fato é que o pensamento social da Igreja alcança repercussão na sociedade. E, é nesse sentido, que a proposta do Papa Francisco para construir um novo modelo econômico sugere uma alternativa ao sistema atual. Na perspectiva da sinodalidade, que Francisco busca para a Igreja, ele propõe o debate sobre a economia sem apresentar, ele mesmo, uma proposta pronta, ao contrário, expõe princípios sobre os quais tal economia deve ser construída, especialmente, pelos jovens.

    Assim sendo, a convocação do Papa Francisco aos jovens do mundo inteiro, em Assis, Itália, começa a ganhar a atenção, não só da Igreja e nem só dos jovens, mas também de grandes líderes, países, empresas e religiões. Tal iniciativa do Papa trata-se de uma porta que se abre. Mais que apresentar respostas, a iniciativa do Papa parece ter a força de catalisar a insatisfação de muitos seguimentos da sociedade, que não acreditam que simples reparos ou reformas, no modelo econômico atual, sejam suficientes para superar a crescente desigualdade entre ricos e pobres. De Assis, o Papa Francisco sonha em impulsionar uma economia, baseada na sobriedade, na integração com o meio ambiente, que promova os pobres e que seja geradora de vida a todas as pessoas e ao planeta.

    Francisco não propõe um novo modelo econômico, mas propõe que um novo modelo econômico seja construído pelos jovens, com o objetivo de promover a vida e a casa comum, ao invés do lucro e do capital. Já existem várias iniciativas de grupos no mundo, associações, cooperativas e pessoas que apresentam novas formas de trabalho, voltadas à realização da vida, à produção orgânica, ao extrativismo, à produção sustentável e às novas formas de consumo, de produção e de remuneração. Compartilhar essas experiências, conectar ações, promover trocas, priorizar a partilha e a diversidade sinalizam, sem dúvidas, uma alternativa para o capitalismo globalizante, que padroniza, massifica e produz o círculo vicioso do consumo.

    Já na encíclica “Laudato Si” o Papa aponta a necessidade de uma nova maneira de se relacionar com a criação que, consequentemente, também ser refere às relações de trabalho. A perspectiva do Papa é a do valor da vida e da criação sobre a do capital, “a realidade social do mundo atual exige que, acima dos limitados interesses das empresas e duma discutível racionalidade econômica, “se continue a perseguir como prioritário o objetivo do acesso ao trabalho para todos” (Francisco, 2015, 127). O trabalho é concebido como participação humanas nos projetos de Deus da criação e de salvação.

    O modelo econômico capitalista tem gerado inúmeras consequências destrutivas para a vida humana e a todas as formas de vida do planeta. A revolução 4.0 [4] diminui as possibilidades de empregos formais, os detentores do capital militam junto aos governos dos países pela flexibilização e extinção dos direitos dos trabalhadores a pretextos de gerar mais empregos, milhares de trabalhadores são empurrados para a informalidade e a propaganda oficial do sistema enaltece o empreendedorismo e a criatividade competitiva como caminhos para prosperidade, gerando precarização e novas formas de escravidão no trabalho.

    Em diversas partes do mundo surgem iniciativas reivindicando uma nova orientação para o trabalho e para a economia como, por exemplo, a mobilização global que questiona o modelo das plataformas digitais dos aplicativos de serviços. Como a ação de “milhares de trabalhadores organizados nessas associações vão sair às ruas para realizar manifestações, reuniões e paralisações de trabalho exigindo o fim da exploração da economia de plataforma e que os direitos básicos dos trabalhadores sejam protegidos” (El SALTO, 2020).

    O Papa aponta para um estilo de vida mais sóbrio, para superar a cultura do consumo e do descartável. Francisco, de quem se espera uma reforma da Cúria Romana e no interior da Igreja, tem se destacado com líder mundial capaz de apresentar pautas importantes para a humanidade, não apenas para a Igreja. Denunciando, dialogando e propondo caminhos o Papa tem tocado em temas sensíveis a todos os habitantes do planeta: sobre os refugiados, as vítimas dos conflitos, os pobres, a fome entre outros. Sempre indo ao encontro de todos. Além disso, tem dialogado com líderes políticos e religiosos. Ele tem proposto, especialmente, pelo exemplo, uma fraternidade mundial, um Pacto Global pela Educação, o Dia Mundial do Pobre, o Sínodo da Amazônia e a iniciativa da Economia de Francisco e Clara.

    Ao propor o encontro de Assis, Francisco sugere a busca de uma alternativa, jovial e criativa, para superar o que ele tem qualificado de economia sem alma. O sistema econômico predominante no mundo tem fragilizado cada vez mais a condição dos trabalhadores, com empregos com remuneração cada vez menor, a extinção de postos de trabalho e o empobrecimento dos trabalhadores em detrimentos dos detentores do capital. O Papa defende que a humanidade precisa mudar a finalidade da economia, colocando o ser humano e o planeta no centro da economia. Francisco acredita que isso pode dar alma a economia.

    O vida e o trabalho sempre estiveram no centro das preocupações da Igreja, daí a preocupação de Francisco com os rumos da economia mundial que instrumentaliza e exclui as pessoas em detrimento aos lucros e ao capital:

    Somos chamados ao trabalho desde a nossa criação. Não se deve procurar que o progresso tecnológico substitua cada vez mais o trabalho humano: procedendo assim, a humanidade prejudicar-se-ia a si mesma. O trabalho é uma necessidade, faz parte do sentido da vida nesta terra, é caminho de maturação, desenvolvimento humano e realização pessoal. Neste sentido, ajudar os pobres com o dinheiro deve ser sempre um remédio provisório para enfrentar emergências. O verdadeiro objetivo deveria ser sempre consentir-lhes uma vida digna através do trabalho. Mas a orientação da economia favoreceu um tipo de progresso tecnológico cuja finalidade é reduzir os custos de produção com base na diminuição dos postos de trabalho, que são substituídos por máquinas. É mais um exemplo de como a ação do homem se pode voltar contra si mesmo. A diminuição dos postos de trabalho “tem também um impacto negativo no plano económico com a progressiva corrosão do ‘capital social’, isto é, daquele conjunto de relações de confiança, de credibilidade, de respeito das regras, indispensável em qualquer convivência civil”. Em suma, “os custos humanos são sempre também custos económicos, e as disfunções econômicas acarretam sempre também custos humanos”. Renunciar a investir nas pessoas para se obter maior receita imediata é um péssimo negócio para a sociedade (FRANCISCO, 2015, 128).

    O Papa Francisco sugere que a humanidade assuma o compromisso de uma renda universal. Não é uma ideia originalmente do papa, mas em muitos lugares do mundo alguns teóricos já propuseram projetos dessa conotação. No Brasil há décadas o líder político e social, Eduardo Suplicy, milita defendendo o projeto por ele intitulado renda mínima. Vários países já esboçaram projetos de transferência de renda como o bolsa família no Brasil, porém é a Finlândia o primeiro país a adotar um compromisso de uma renda universal para todos os seus cidadãos.

    Nesse sentido, o Papa tem procurado sensibilizar os líderes políticos e econômicos mundiais da necessidade de um programa de renda universal, para que todas as pessoas tenham acesso aos serviços essenciais, não como uma recompensa, mas como um direito. Esse fundamento não se baseia na recompensa do trabalho de alguém para a geração de riquezas, mas de que todos dispomos das riquezas naturais, dom de Deus, e temos o mesmo direito de usufruir desse dom. É uma profunda inversão do conceito de remuneração reconhecendo que a intervenção do homem na natureza pelo trabalho gera riquezas, mas existe uma riqueza natural, suficiente e patrimônio universal, que todas as pessoas do planeta deveriam ter o direito de usufruir.

    Considerações Finais

    Como no sínodo da Amazônia, em que o Papa Francisco propõe sonhos para a Casa Comum, o movimento por uma nova economia é um sonho que vai se materializando à medida em que mais pessoas vão assumindo os valores da vida e do Evangelho. As mudanças começam por iniciativas e, sem dúvidas, o que faz Francisco é um passo que congrega várias iniciativas alternativas pelo mundo e impulsionadora de muitas outras.

    Alguns temas são basilares para a alma da nova economia sonhada por Francisco, a saber: centralidade da vida e da casa comum; a inclusão de todos no mundo do trabalho; renda universal. Em todo caso, quando afirma que a economia está em função da política, Francisco aponta que a política é arte do cuidado da vida e do planeta. Portanto, uma autêntica economia é aquela que está a serviço dessas prioridades.

    Ademais, a inclusão de todos é outra perspectiva elementar. Na lógica capitalista só há lugar para os melhores, aos mais produtivos e aos mais lucrativos. Entretanto, esse paradigma precisa ser superado por um modelo que inclua a todos, ou seja, no qual o trabalho não seja, exclusivamente, uma engrenagem do sistema, mas um direito de todas as pessoas. Somos chamados a compreender esse direito ao trabalho como algo construtivo do ser humano, assim como, também da espiritualidade cristã:

    Qualquer forma de trabalho pressupõe uma concepção sobre a relação que o ser humano pode ou deve estabelecer com o outro diverso de si mesmo. A espiritualidade cristã, a par da admiração contemplativa das criaturas que encontramos em São Francisco de Assis, desenvolveu também uma rica e sadia compreensão do trabalho, como podemos encontrar, por exemplo, na vida do Beato Carlos de Foucauld e seus discípulos (FRANCISCO, 2015, 125).

    Outra ideia clara no pensamento do Papa Francisco é o direito de uma renda universal, no sentido oposto da lógica da economia mundial, em que o salário é uma recompensa pela produtividade. Por fim, uma economia com alma deve fazer com que todas as conquistas da economia e das ciências possam ser acessíveis a todas as pessoas: “Talvez seja a hora de pensar em um salário universal que reconheça e dignifique as tarefas nobres e insubstituíveis que vocês realizam; capaz de garantir e tornar realidade esse slogan tão humano e cristão: nenhum trabalhador sem direitos” (FRANCISCO, 2020).

    Notas

    [1] Economia de Francisco: O Papa Francisco lançou esse convite aos jovens empreendedores do mundo todo para pensarem modelos alternativos de economia. O encontro foi inicialmente marcado para março de 2020, mas no contexto da pandemia, foi adiado para novembro do mesmo ano. A carta convocatória pode ser acessada, em: http://www.vatican.va/content/francesco/pt/letters/2019/documents/papa-francesco_20190501_giovani-imprenditori.html >. Acesso em 01 de maio 2019.
    [2] Thomas Piketty é um economista francês que se tornou figura de destaque internacional com seu livro “O Capital no século XXI” (2013). Sua obra mostra que, nos países desenvolvidos, a taxa de acumulação de renda é maior do que as taxas de crescimento econômico. Segundo Piketty, tal tendência é uma ameaça à democracia e deve ser combatida através da taxação de fortunas. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Thomas_Piketty>. Acesso em 13 de nov. 2020.
    [3] Carta Capital: “A desigualdade já estava aumentando e a Covid acelerou um processo que já vinha acontecendo no mundo todo. Os bilionários ficaram mais ricos ainda e, do outro lado, temos uma parcela da população que estava relativamente sob controle – embora sempre estivesse sob o risco de exclusão social – e agora, efetivamente, caiu”, comenta. “São pessoas que entraram em uma situação de altíssima vulnerabilidade”. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/sociedade/por-que-ricos-ficaram-mais-ricos-e-pobreza-explodiu-na-pandemia/ . Acesso em 13 de nov. 2020.
    [4] Indústria 4.0 ou Quarta Revolução Industrial é uma expressão que engloba algumas tecnologias para automação e troca de dados e utiliza conceitos de Sistemas ciber-físicos, Internet das Coisas e Computação em Nuvem. A Indústria 4.0 facilita a visão e execução de “Fábricas Inteligentes” com as suas estruturas modulares, os sistemas ciber-físicos monitoram os processos físicos, criam uma cópia virtual do mundo físico e tomam decisões descentralizadas. Com a internet das coisas, os sistemas ciber-físicos comunicam e cooperam entre si e com os humanos em tempo real, e através da computação em nuvem, ambos os serviços internos e intraorganizacionais são oferecidos e utilizados pelos participantes da cadeia de valor. Estas novas tecnologias trazem inúmeras oportunidades para a agregação de valor aos clientes e aumento de produtividade de processos, mas sem o enfoque adequado podem desperdiçar grandes investimentos, com poucos resultados. Em: Wikipédia enciclopédia livrept <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ind%C3%BAstria_4.0#:~:text=Ind%C3%BAstria%204.0%20ou%20Quarta%20Revolu%C3%A7%C3%A3o,Coisas%20e%20Computa%C3%A7%C3%A3o%20em%20Nuvem.> Acesso em 1 dez. 2020.

    Referências

    CUNHA, Otávio Augusto. Sujeito empreendedor, alienado e servil. Disponível em:< http://www.ihu.unisinos.br/603564-sujeito-empreendedor-alienado-e-servil >. Acesso 14 out. 2020.
    CUNHA, Otávio Augusto. Sujeito empreendedor, alienado e servil. Disponível em: < http://www.ihu.unisinos.br/603564-sujeito-empreendedor-alienado-e-servil>. Acesso 27 out. 2020.
    FRANCISCO, Papa. CARTA DO PAPA FRANCISCO AOS MOVIMENTOS POPULARES. Disponível em:< http://www.vatican.va/content/francesco/pt/letters/2020/documents/papa-francesco_20200412_lettera-movimentipopolari.html>. Acesso 19 nov. 2020.
    FRANCISCO, Papa. CARTA DO PAPA FRANCISCO PARA O EVENTO “ECONOMY OF FRANCESCO”. Disponível em:< http://www.vatican.va/content/francesco/pt/letters/2019/documents/papa-francesco_20190501_giovani-imprenditori.html>. Acesso 19 nov. 2020.
    FRANCISCO, Papa. FRATELLI TUTTI: CARTA ENCÍCLICA SOBRE A FRATERNIDADE E A AMIZADE SOCIAL. Disponível em: <http://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20201003_enciclica-fratelli-tutti.html>. Acesso 26 out. 2020.
    FRANCISCO, Papa. LAUDATO SI, SOBRE O CUIDADO DA CASA COMUM. Disponível em: <http://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html >. Acesso 19 nov. 2020.
    ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Futuro do trabalho no Brasil. Perspectivas e diálogos tripartites. Disponível em: https://www.ilo.org/brasilia/publicacoes/WCMS_626908/lang–pt/index.htm. Acesso 14 out. 2020.
    RÊGO BARRETO, Helena Martins do. Uma política de renda justa é necessária para enfrentar os efeitos da reestruturação produtiva. Disponível em: < http://www.ihu.unisinos.br/603301-uma-politica-de-renda-justa-e-necessaria-para-enfrentar-os-efeitos-da-reestruturacao-produtiva-entrevista-especial-com-helena-martins>. Acesso 26 out. 2020.
    SANSON, Cesar. A revolução 4.0 e a uberização anunciam efeitos devastadores no mundo do trabalho. Disponível em: <http://www.ihu.unisinos.br/603353-a-revolucao-4-0-e-a-uberizacao-anunciam-efeitos-devastadores-no-mundo-do-trabalho>. Acesso 26 out. 2020.
    SANSON, Cesar. Debate teórico sobre o lugar do trabalho na sociedade contemporânea. Disponível em: < http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/570888-debate-teorico-sobre-o-lugar-do-trabalho-na-sociedade-contemporanea-em-edicao >. Acesso 27 out. 2020.

    Notas

    [1] Arruda, Marcos, 2009, “Educação para uma Economia do Amor”, Editora Ideias e Letras, São Paulo: 164;
    [2] http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/589076-economia-de-francisco-assis-26-28-de-marco-de-2020-mensagem-do-papa-francisco-para-o-evento
    [3] Arruda, Marcos, 2019, “Vivendo o Futuro no Presente: Notas de Viagem ao Butão, Laos e Vietnã”, http://pacs.org.br/?p=6842 (e-livro).
    [4] Razeto, Luis M., 2018 – La Crisis de la Civilización Moderna y la Creación de una Nueva Civilización, monografia, Santiago, Chile.
    [5] Fernando Huanacuni, 2015, “Vivir Bien/Buen Vivir – Filosofía, Políticas, Estrategias y Experiencias de los Pueblos Ancestrales”, CAOI, Coordinadora Andina de Organizaciones Indígenas. La Paz, Bolivia.
    [6] Euclides Mance, 2017, “Buen Vivir y Economía Solidaria”, monografia, IFIL.

     

    Fabio Antunes do Nascimento é professor da Universidade Católica Dom Bosco, Campo Grande, MS, graduado em Teologia pelo Instituto Teológico João Paulo II, possui Mestrado em Teologia Pastoral pelo CEBITEPAL – Bogotá, Colombia e é doutorando em Teologia pelo CEBITEPAL – Bogotá, Colombia.

     

  • Stédile analisa a conjuntura e convoca uma grande Frente Popular em defesa das bandeiras populares

    João Pedro Stédile, em artigo publicado no site Poder 360, faz um balanço do ano 2020 e convoca uma grande Frente Popular reunindo as forças sociais na luta por bandeiras prioritárias como: vacina já, pública e para todos. Auxílio Emergencial até o final da pandemia. Exigir um plano nacional de emprego. Lutar pelo “Fora Bolsonaro”. Aprovar a taxação dos mais ricos. Lutar contra as privatizações. Lutar contra o racismo e a violência contra as mulheres.

    Protesto do Coletivo Alvorada de BH, da Frente Brasil Popular, no Rio de Janeiro, em outubro de 2020. Imagem publicada por Poder360

    Em defesa da frente popular contra crise e efeitos da pandemia, por Stedile

    Por João Pedro Stédile – 10.jan.2021 – in: https://www.poder360.com.br/opiniao/brasil

    O ano de 2020 ficou marcado por 3 fatos principais que trouxeram enormes consequências para a vida de nosso povo: a crise econômica capitalista, a disseminação da covid-19 e o impacto sobre a sociedade e o comportamento de um governo insano e genocida, com seus métodos fascistas de governar para uma minoria de apoiadores fanáticos.

    A crise capitalista instalada em todo mundo desde 2008 se agravou no Brasil a partir de 2014. Desde então, o quadro tem deteriorado ainda mais com as medidas neoliberais que só protegem o capital financeiro e as corporações internacionais.

    No ano passado, o PIB brasileiro caiu 5%; a taxa de investimentos produtivos para alavancar o crescimento da economia caiu para 15,4% (já tivemos 21% em 2013 e, nos anos dourados, chegou a 30%).

    Até o capital estrangeiro se deu conta. A fuga de investidores estrangeiros da bolsa de valores brasileira representou R$ 87,5 bilhões, quase o dobro da saída de 2019, que foi de R$ 45 bilhões. E os indicadores da indústria assustam ainda mais, com a queda para 11% do PIB (em 2004, representava 18%). Nenhum país se desenvolve sem uma indústria forte.

    Na agricultura, o modelo do agronegócio se mantém predominante e crescente, porém produz apenas commodities para exportação, deixando em segundo plano a garantia de alimentos de qualidade e a preço justo para o mercado interno. Hoje 80% de nossas terras e forças produtivas agrícolas estão voltadas apenas para produzir soja, milho, cana, algodão e pecuária extensiva.

    As corporações transnacionais que controlam os insumos e os grandes proprietários de terra ganham muito dinheiro. Mas a sociedade e a economia como um todo, não. Sem contar que ainda estamos em uma etapa pré-Estado moderno. Os ruralistas se negam a pagar impostos sobre exportação (protegidos pela Lei Kandir, aprovada pelo governo FHC) e se negam a pagar ICMS sobre os agrotóxicos e outros produtos, como se viu agora em São Paulo. Ou seja, é o rentismo agrícola, utilizando nossos recursos naturais, a infraestrutura e a logística sem dar contribuição para o Estado, para os serviços públicos e para o conjunto da sociedade.

    Na Argentina, para dar uma dimensão, soja paga 35% de impostos sobre exportações, e os recursos vão direto para programas sociais de distribuição de renda. Ou seja, a renda extraordinária do boom dos preços internacionais das commodities e da alta do dólar é repartida entre todos os cidadãos.

    O agronegócio exerceu sua força e influência no governo e tratou de tirar proveito. Liberaram mais de 300 novos tipos de agrotóxicos, que matam a biodiversidade, contaminam as águas e os alimentos e provocam doenças, enfermidades e até câncer, de acordo com estudos científicos. Tudo isso vai no caminho inverso do progresso. A Europa proíbe a prática da pulverização aérea de venenos e deu prazo de tempo para tirar o mercado a substância do glifosato. No México, o governo acaba de decretar que em 3 anos deve eliminar os agrotóxicos e as sementes transgênicas da sua agricultura.

    Não bastasse o modelo concentrador de renda do agronegócio, o latifúndio atrasado, predador e que não produz nada voltou com toda força e apoio do governo.

    Os latifundiários, atrasados na sua forma de acumulação primitiva, são alavancados pelo capital financeiro e, com isso, buscam se apropriar dos bens da natureza (terras públicas, minérios, biodiversidade, florestas, água e até o oxigênio das florestas) para vendê-los como crédito de carbono.

    Essa sanha de acumulação máxima com os bens da natureza acontece em detrimento das necessidades de todo o povo. Essa política ficou famosa na expressão “É hora de passar a boiada!”, ou seja, se apropriar de tudo o que puderem, em quanto der tempo…

    O resultado escancarou as consequências para toda a sociedade. Nunca tivemos tantas queimadas. Não apenas no bioma da Amazônia, mas também no Pantanal e no Cerrado. As alterações climáticas são perceptíveis a qualquer cidadão. Até em São paulo, nossa maior metrópole, a população sofre com chuvas irregulares e com a noite no meio do dia causada pela fumaça das queimadas no centro-oeste e no norte do país.

    Nenhuma área indígena e quilombola foi regularizada nos últimos quatro anos. Nunca tivemos tantas invasões de fazendeiros em suas áreas. Mais de 20 mil garimpeiros foram estimulados e estão protegidos explorando minérios em áreas indígenas. A violência contra esses brasileiros tem alcançado índices inaceitáveis.

    O Estado e o governo abandonaram também todas as políticas de estímulo à produção de alimentos e de atenção à chamada agricultura familiar e camponesa, que produz para o abastecimento do mercado interno. Não há mais assistência técnica, programas de habitação rural nem programa de compra de alimentos.

    Os ruralistas que ocupam o governo se orgulham de dizer que enterraram a reforma agrária, uma política de Estado prevista na Constituição de 1988 como forma de garantir o direito ao trabalho nas terras. Foi justamente para isso que o latifúndio e o agronegócio elegeram esse governo. Faz sentido!

    PANDEMIA E CONDIÇÕES DE VIDA

    Não bastasse os resultados na economia, provocadas pela crise capitalista e por uma política econômica ultraneoliberal, tivemos então a pandemia do coronavírus. Um inimigo invisível e mortal atingiu a mais de 8 milhões de brasileiros e levou para o cemitério ao redor de 200 mil pessoas, de todas as idades e classes sociais. Até médicos, enfermeiros e pessoas que atuavam ajudando os outros pagaram esse alto preço.

    Esse inimigo comum não foi contido pela falta de um governo federal com representatividade, capacidade e moral para coordenar as ações contra a expansão da pandemia. Ficou aquém também a compreensão da sociedade em relação à necessidade de atuar de forma coletiva para enfrentar essa guerra.

    Outros países organizaram a sociedade de forma diferente, priorizaram o combate unitário ao inimigo e obtiveram resultados mais positivos. No Vietnã, por exemplo, morreram menos de 100 pessoas. Na Indonésia, país com mais de 280 milhões de habitantes, três mil pessoas perderam a vida.

    Aqui, o Estado e o governo se aliaram ao inimigo. Dentro da sociedade, lamentavelmente, prevaleceram atitudes oportunistas que mantiveram em circulação vetores de contaminação do vírus.

    O povo trabalhador jogado à sua própria sorte tem que abandonar os cuidados e buscar formas de sobrevivência na rua. O auxílio emergencial de R$ 600, proposto pela oposição e efetivado por iniciativa do Congresso Nacional, agora está encerrado. Os resultados dessa politica insana e genocida não aparecem só nos mortos, mas também em todos indicadores sociais das condições de vida da população.

    O Brasil está entre os 83 países com piores condições de vida da população, mesmo sendo a 13ª economia do mundo. Somos junto com a  África do Sul o pior país em desigualdade social. Terminamos o ano com 14% de desemprego, que mede apenas quem procura trabalho. Temos 60 milhões de trabalhadores adultos, à margem da economia e dos direitos sociais. É um Brasil rejeitado, mantido à margem pelo Estado excludente e por uma burguesia burra e estúpida que não pensa a Nação.

    Nunca tivemos tanta violência urbana. Nunca tivemos tanto ódio e racismo. A violência contra as mulheres, dentro de casa. Os casos de feminicídio chegaram a um patamar alarmante, praticados também por senhores brancos “de bem”, endinheirados, que roubaram a vida de suas ex-companheiras em todas as classes sociais.

    A fome afeta 12 milhões de brasileiros; outros 20% se alimentam aquém das necessidades. A inflação dos alimentos varia entre 20% e 80% de acordo com o produto, afetando os mais pobres. O programa Minha Casa Minha Vida foi interrompido.

    Cerca de 60 países já estão vacinando sua população, enquanto por aqui o ministro da Saúde deve estar estudando geografia para descobrir aonde passa a linha do Equador…

    UM GOVERNO INSANO E GENOCIDA

    A cada dia fica mais evidente a natureza do governo Bolsonaro, que se converteu em insano e genocida, nefasto ao povo brasileiro e para a democracia. A opinião de alguns ex-ministros como o General Santos Cruz, o dr. Henrique Mandetta e o consultor Sérgio Moro, que conhecem bem a casa por dentro, é suficiente para entender de que gente se trata essa que está mandando no Brasil.

    É positivo que mais vozes agora se levantem contra o governo nos jornais e tevês, que antes o apoiaram, e até entre intelectuais que haviam pedido voto. A pergunta que todos estão se fazendo é de onde vem a força política que sustenta Bolsonaro.

    Não se pode simplificar à tutela militar, pois apesar dos 6.157 oficiais das três armas estarem presentes no governo, parece se tratar de oportunismos pessoais para abocanhar pequenos privilégios e melhorar a carreira.

    O ministro da Defesa não se cansa de alertar que as Forças Armadas não participam do governo, que são apenas instrumentos de Estado. O desempenho profissional pífio nas funções administrativas dos militares, inclusive, deve envergonhar todos, em especial o Exército, a Marinha e a Aeronáutica. Espero que algum dia o general Villas Boas peça desculpas de público pela arapuca que armou contra todo o povo, que só ele e o capitão sabem…

    É certo que parte da burguesia, com seus banqueiros e corporações transnacionais, continua apostando no plano de Paulo Guedes, sedentos por mais privatizações, como da Eletrobras, Correios e Caixa.

    O governo não tem projeto de nação e não tem hegemonia ideológica e política na sociedade. Teve um resultado negativo nas eleições municipais, nas quais todos os que se identificaram com o bolsonarismo perderam.

    Não há nada que demonstre que as ideias neofascistas sejam majoritárias na sociedade. Ao contrário, seus discursos, teses e exemplos são defendidos apenas por fanáticos, que não devem ser mais que 10%, como existem em toda a sociedade.

    Então, os fatos mais recentes nos fazem mudar a pergunta e, em vez de perguntar quem o sustenta, devemos nos questionar até quando aguentaremos tamanha incompetência e insanidade…

    PERSPECTIVAS PARA 2021

    Diante dessa realidade tão dura, que tem custado tantas vidas, tanto sacrifício e levado ao desânimo o nosso povo, as saídas não são simples e não se resumem ao curto prazo.

    Há uma missão permanente da natureza de nosso trabalho, nos movimentos populares, que nos impõe a tarefa de organizar de todas as formas possíveis a classe trabalhadora. Sobretudo, aquele contingente do “Brasil rejeitado” de 60 milhões de adultos abandonados à sua própria sorte, sem emprego, renda e futuro.

    Sabemos que sua maioria é de mulheres, chefes de família, jovens, negros e que moram nas periferias das cidades. Precisamos organizá-los para que lutem na defesa de seus direitos e conquistem soluções para seus problemas.

    Defendemos a construção imediata de uma Frente Popular, que reúna os movimentos populares que integram a Frente Brasil Popular e a Frente Povo Sem Medo, centrais sindicais, partidos políticos, movimento interreligiosos, as entidades civis, coletivos de juventude, os artistas e os intelectuais.

    A construção dessa frente em torno da defesa de medidas urgentes e dos interesses populares deve girar em torno de uma pauta unitária, que está em debate em diversos espaços com os seguintes pontos:

    1. Lutar pela vacina já, pública e para todos os brasileiros, de forma urgente e prioritária, fortalecendo o SUS com os recursos necessários.
    2. Garantir a manutenção do Auxílio Emergencial até o final da crise da pandemia do coronavírus.
    3. Garantir o abastecimento e o acesso a alimentos saudáveis, com preços controlados.
    4. Exigir um plano nacional de emprego para enfrentar a pandemia do desemprego.
    5. Lutar pelo “Fora Bolsonaro”. Esse governo não tem as mínimas condições para enfrentar os problemas nacionais. Há mais de 50 pedidos de impedimento dormindo na Câmara dos Deputados.
    6. Aprovar a taxação dos mais ricos, começando pelos 88 bilionários que enriqueceram na pandemia. Regulamentação da taxação de lucros e dividendos, grandes fortunas, heranças e movimentações dos bancos. Revogar a Lei Kandir. Acabar com a isenção fiscal que desviou R$ 457 bilhões dos cofres públicos em 2020, segundo a Unafisco.
    7. Lutar contra as privatizações e defender a Eletrobras, os Correios, a Caixa, o Serpro, a Petrobras e as terras (que o governo e ruralistas querem entregar 25% de cada município ao capital estrangeiro).
    8. Lutar contra o racismo e qualquer violência contra as mulheres.

    Esse programa mínimo é um ponto de partida para que os movimentos populares, centrais sindicais, entidades da sociedade, partidos e as diferentes formas de organização da sociedade façam o debate para que possamos construir a unidade mais ampla em torno de uma plataforma popular.

    A consolidação dessa unidade depende da luta social de massas em torno dessa plataforma, o que só vira depois da vacina. Mas virá. E o aumento dos problemas sociais aumentarão as contradições e os conflitos sociais, que eclodirão em algum momento, queiram os governantes ou não.

    É evidente que a recomposição democrática das nossas instituições implica também passar a limpo as falcatruas que vem desde golpe ilegítimo contra a presidenta Dilma Rousseff em 2016.

    Os direitos sociais, trabalhistas e previdenciários assegurados na Constituinte devem ser recompostos, assim como a politica externa soberana. A perseguição ao presidente Lula pela quadrilha de Curitiba, o assassinato da vereadora Marielle Franco e o esquema de desvio de recursos públicos das “rachadinhas” precisam de resposta.

    No médio prazo, precisamos construir um novo projeto de pais. Um projeto de Nação, que reorganize a nossa economia com base na produção na  indústria e na agricultura para garantir os bens, o trabalho e a renda para todo o povo brasileiro.

    Um projeto fundado na universalização dos direitos a educação, saúde, terra, moradia digna e de cultura. Só um projeto que combata a desigualdade social poderá construir uma sociedade mais  justa, com igualdade e harmonia.

    As eleições de 2022 são uma etapa nesse processo para congregar as forças políticas em torno desse novo projeto, que precisa construir uma maioria popular nas instâncias do Estado. Por isso, o debate não pode se limitar a disputas menores de nomes e partidos. Se não construirmos essas alternativas, certamente a crise se aprofundará e terá um custo cada vez maior para o nosso povo.

     

  • 2020: um ano que não foi… 2021 será?
    Por Jorge Alexandre Alves

     

    Já estamos em um novo ano, mas parece que o velho ainda não acabou. 2021 começa dando a impressão que continuaremos vivendo as tragédias de 2020. Na iminência de alcançarmos 200 mil mortes nesta pandemia, parece que a dor de tantas famílias continua a ser solenemente ignoradas. Para estes, 2020 representou uma profunda marca causada pelas dolorosas perdas.

    A economia arruinada, um governo que destrói o Estado brasileiro dia após dia e a pandemia de COVID-19 avança sem dar sinais de retrocesso. Boa parte da população parece ter se cansado das medidas de proteção contra o vírus e se jogou de cabeça em confraternizações, festas e aglomerações. Parece que os laços sociais se dissolveram por completo, o que talvez explique o comportamento de tantos.

    No plano pessoal, mais e mais pessoas próximas e queridas foram contaminadas pelo coronavírus. Referências e figuras importantes morrem e nos deixam órfãos. Entes queridos de amigos e companheiros de luta perdem suas pessoas amadas. Olhar para frente e fazer planos para o ano que começa se torna um exercício de fantasia.

    Ao mesmo tempo parece que o fundamentalismo religioso avança e reforça a negação e a oposição às medidas de saúde necessárias nesse momento. Falsos demônios são exorcizados em nome de um deus que se alimenta da morte e do caos social. Até o Papa Francisco – o único estadista em escala mundial – sofre ataques diuturnamente.

    Não temos o menor sinal de que a economia será reorganizada em função das necessidades dos mais pobres e dos que mais precisam. O presidente da República se apequena cada vez mais no cargo e parece sabotar qualquer possibilidade do Brasil vencer a pandemia. Mais que isso, foi capaz de afirmar que o país está quebrado e nada pode fazer.

    Aliás, uma coisa ele faz: transfere suas responsabilidades para terceiros, subterfúgio para disfarçar a inércia do governo no combate da pandemia. Fica-se com a impressão que uma verdadeira campanha de vacinação somente ocorrerá se beneficiar politicamente apenas o sujeito que hoje ocupa o Palácio do Planalto. Ele comete crimes de responsabilidade cotidianamente, mas as instituições brasileiras estão de joelhos, fingindo que nada acontece diante do descalabro que hoje desgraça este país.

    Hoje a população assiste o mundo começar a se vacinar, enquanto ficamos na incerteza. Pior que assistir nossos vizinhos – com economias menos poderosas que a nossa – adquirir vacinas e começar a imunizar seus cidadãos, é sequer saber quando começaremos de fato a ser vacinados. A verdade é que hoje não há como sequer garantir que a nossa gente brasileira será imunizada contra a Covid-19 em 2021.

    Para tornar o cenário mais trágico ainda, a ANVISA acena com a possibilidade de autorizar a importação das vacinas pelas clínicas particulares de imunização antes mesmo da campanha pública de vacinação. Essa iniciativa, se concretizada, pode ser reveladora das intenções do governo. Evidentemente, esse tipo de medida, com um governo que pouco se importa com a classe trabalhadora, não deveria causar surpresa.

    Entretanto, tal possibilidade é muito sórdida, para dizer o mínimo. Quando a sociedade brasileira começou a discutir a questão da vacinação, certamente muitos de nós tivemos dificuldades em imaginar indivíduos oriundos das famílias mais ricas em uma fila de imunização em um posto de saúde. Temos uma história escravocrata que nos levou a uma das maiores desigualdades sociais do mundo, produziu o racismo estrutural e uma elite que se vê como uma aristocracia.

    Nesse contexto, é realmente difícil pensar que os do “andar de cima” iriam sequer cogitar se misturar com o povão do qual essa gente se acha dona. Se ter pessoas mais humildes frequentando aeroportos para andar de avião causou reclamações em rede social, que dirá a possibilidade de reunir alguém que mora em uma cobertura em Ipanema ou nos Jardins na mesma fila de um morador de uma favela? Mas a sordidez da venda de vacinas não está apenas no elitismo de nossa classe dirigente.

    Além de imunizar a classe A de forma asséptica, sem causar o incômodo de misturá-los com os demais estratos sociais, a vacinação dos ricos (que podem pagar caro pelo imunizante) poderá beneficiar o governo. Ora, a elite brasileira vacinada significa uma pressão muito menor sobre o presidente brasileiro. Se os donos do poder e do dinheiro não correm mais riscos, a saúde do restante da população vira tema secundário, como tem sido regra nos últimos anos.

    Os miseráveis, pobres e parcela dos segmentos médios já vêm sendo oprimidos de diversas formas há tempos e não se vislumbra mudanças nesse cenário. Se os que detém o capital puderem pagar pela sua vacinação, em breve pressionarão o país para que a economia volte a funcionar de forma irrestrita. Neste cenário, pouco importará se as condições sanitárias serão ou não boas e se trabalhadores e trabalhadoras estarão mais ou menos expostos ao vírus.

    Parte dessa mesma elite foi às ruas em apoio ao presidente e exigir a reabertura do comércio, oito meses atrás. Foi constrangedor ver aqueles automóveis luxuosos e caros nas carretas em várias cidades do país, exigindo a volta das atividades comerciais. Chantagearam os trabalhadores: ou perderiam seus empregos ou arriscariam a vida nas aglomerações do transporte público.

    De certa forma, foi o que vimos durante toda a pandemia, em nome da salvação da economia. Fingiu-se que os tão falados protocolos funcionavam quando apenas valiam no papel. E testemunhamos como as autoridades capitularam diante das mais variadas formas de aglomeração. Em muitos lugares, viveu-se uma quarentena de araque.

    Barbaridades foram cometidas em nome da economia e da suposta saúde mental de parcela da população. Expusemos professores em nome de salvar o ano letivo de crianças e jovens. Qual foi o resultado? Teremos condições seguras para retomar as aulas presenciais ao final do mês?

    Enfim, a sensação que se tem é de total abandono. Ao que parece, mais do que nunca estamos por nossa própria conta. Temos a difícil missão de espalhar solidariedade e empatia em cenário tão adverso e com tanta gente pouco se importando com a sociedade.

    Como fazer isso? Achar essa resposta será crucial para que 2021 não seja outro ano que não foi, como ocorreu com 2020. Ao mesmo tempo, embora não tenha sido, as vezes parece que 2020 ainda não acabou…

    *Jorge Alexandre Alves é sociólogo, professor e faz parte do Movimento Fé e Política.

  • Everanice, esposa de Roberto Malvezzi, o ‘Gogó’, faleceu hoje, em Juazeiro (BA), vítima da covid-19

    Faleceu nesta terça-feira, dia 5 de janeiro, vítima da covid-19, a esposa de Roberto Malvezzi, o ‘Gogó’, da Diocese de Juazeiro (BA).

    Everanice Muniz Malvezzi, a Vera, como era conhecida, estava internada no Hospital Promatre de Juazeiro.

    Nas redes sociais, ‘Gogó’ comunicou o falecimento da companheira e relatou o seu carinho pela mesma. Acompanhe:

    Comunico que Everanice Muniz Malvezzi, a Vera, minha esposa, faleceu hoje há pouco. Minha companheira de 35 anos de vida.
    Fico eu, Roberto, e os filhos e filhas: Amaranta, Tamira, Amarildo e Tássio. Minha Nega de beleza exuberante se foi.
    Deus pôs, Deus tirou, louvado seja Deus.
    Grato a todos e todas pelas orações e a solidariedade.
    Roberto Malvezzi (Gogó). 

    Gogó, da diocese de Juazeiro, BA, é uma importante liderança da Pastoral da Terra e da luta pela sobrevivência do povo do semiárido do Nordeste brasileiro, tendo contribuído para a ampliação do projeto das cisternas e de outros projetos que contribuíram para a melhora da qualidade de vida daquele povo.
    Também foi um assessor importante no Sínodo para Amazônia, tendo contribuído com todo o processo de formação.
    Por enquanto somos tomados pela surpresa da notícia e louvamos a Deus por tanto bem que essa mulher fez, ao lado do seu marido, pelo povo do semiárido.

    Com informações do blog do Edenevaldo.

  • CNBB emite nota pelo falecimento de Luiz Alberto Gómez de Souza

    MORRE, EM JUIZ DE FORA (MG), O PROFESSOR LUIZ ALBERTO GÓMEZ DE SOUZA, REFERÊNCIA NA IGREJA DO BRASIL

    Luiz Alberto Gómez e Souza faleceu na madrugada desta quarta-feira, dia 30 de dezembro, em Juiz de Fora (MG), em decorrência de um câncer linfático. Ele está sendo velado em casa e seu corpo será cremado.

    Casado desde 1959 com Lúcia Ribeiro, Luiz Alberto deixa uma filha, dois filhos, cinco netos e uma neta. Nascido em Lavras do Sul (RS) em 1935, era bacharel em Direito pela PUC-RS, mestre em Ciência Política pela Escola Latino-Americana de Ciência Política e Administração Pública (ELACP), de Santiago do Chile, e doutor em Sociologia pela Universidade de Paris III Sorbonne Nouvelle, com a tese “Os estudantes católicos e a política”. Em 2018 recebeu o título de Doutor Honoris Causa em Teologia, pela FAJE, de Belo Horizonte, por sua relevante contribuição no campo do Cristianismo.

    Sua vida foi por ele definida como de um “andarilho entre duas fidelidades: religião e sociedade”, título de seu livro de memórias, publicado em 2015. Sua fidelidade à Igreja concretizou-se desde a juventude. Foi dirigente nacional da Juventude Universitária Católica (1956-1958), Secretário-geral da Juventude Estudantil Católica Internacional, em Paris (1959-1961), assessor de Dom Hélder Câmara durante do Concílio Vaticano II, assessor do ministro da Educação Paulo de Tarso dos Santos (1963), assessor de movimentos sociais, pastorais, CEBs e da CNBB, professor na ELACP, em Santiago do Chile (1968-1969), professor na UFRJ, UERJ, PUC-Rio e IUPERJ (1978-1997), assessor do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social (IBRADES), professor visitante e assessor em vários países da América Latina e nos EUA (1966-1997). Foi também funcionário da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL-ONU), em Santiago do Chile e no México (1969-1977), diretor do Escritório da América Latina e do Caribe no Departamento de Desenvolvimento da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) (1982-1985), diretor executivo do Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais (CERIS) (1997-2005). Sua militância na sociedade levou-o ao exílio.

    Luiz Alberto percorreu o Brasil dando cursos de formação a agentes de pastoral, geralmente fazendo dupla com o Padre J. B. Libânio. Sempre convidado a dar cursos e palestras, Luiz Alberto tornou-se bem conhecido e muito respeitado na Igreja e no campo ecumênico. Sua última atividade nesse campo foi como diretor do CERIS (Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais).

    Atualmente dirigia o Programa de Estudos Avançados em Ciência e Religião da Universidade Cândido Mendes. Era autor de mais de uma centena de artigos em diversas línguas sobre educação, Igreja e sociedade, política, ciência e religião, e de vários livros.

    Inúmeras vezes prestou assessorias à CNBB, ajudando-a a caminhar nos caminhos da profecia e da fidelidade ao Evangelho. A CNBB manifesta aos familiares e aos inúmeros amigos de Luiz Alberto o seu mais profundo pesar, na certeza da vida plena, agora vivida por ele, junto a Deus, a quem serviu e amou.

    Veja, aqui, a nota de pesar da CNBB pelo falecimento do professor Luiz Alberto Gomes de Souza ou leia o texto abaixo:

     

    Nota de pesar pelo falecimento do prof. Luiz Alberto Gomes de Souza

    A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) manifesta seu pesar pelo falecimento do sociólogo Luiz Alberto Gomes de Souza, ocorrido hoje, 30 de dezembro de 2020, em Juiz de Fora, MG.

    Gaúcho, nascido em 19/12/1935, deixa o legado de uma vida marcada pelo diálogo entre a fé e o compromisso social, utilizando-se para tanto de seu profundo conhecimento na área das ciências sociais, aliado à firme consciência do laicato como sujeito eclesial.

    Com vasta e conhecida biografia, testemunhou que, “como cristãos, somos chamados a viver como discípulos de Jesus Cristo em nosso dia a dia. A partir da sua vocação específica os cristãos leigos e leigas vivem o seguimento de Jesus na família, na comunidade eclesial, no trabalho profissional, na multiforme participação na sociedade civil, colaborando assim na construção de uma sociedade justa, solidária e pacífica, que seja sinal do Reino de Deus inaugurado por Jesus de Nazaré”. (CNBB, Doc. 105, n. 11)

    A CNBB se solidariza com a família e os amigos mais próximos do Prof. Luiz Alberto e pede a Deus que o laicato brasileiro se consolide cada vez mais no serviço à paz, à justiça, ao bem comum e à democracia.

    Brasília, DF, 30 de dezembro de 2020

    D. Walmor Oliveira de Azevedo
    Arcebispo de Belo Horizonte, MG
    Presidente

  • Nota de Secretários Nacionais de Juventude e Presidentes do CONJUVE em relação à posição da atual SNJ, que defendeu a redução da maioridade penal

    Uma carta assinada por dez ex-secretários da Juventude e ex-presidentes do Conselho de Juventude afirmam que a Secretaria Nacional da Juventude, ligada à pasta da ministra Damares adotou uma prática “típica de grupos autoritários” ao avalizar a redução da maioridade penal à revelia do que diz o Estatuto da Criança e do Adolescente.

    Leia a Nota:

    A Secretaria Nacional de Juventude (SNJ) foi criada no ano de 2005, resultado das lutas coletivas e sociais da juventude brasileira, e desenvolvida com a afirmação e ampliação dos direitos dessas juventudes. Nos seus 15 anos de atuação, dialogou com organismos internacionais, espaços governamentais e com o parlamento; e formulou e fundamentou suas diretrizes em potentes espaços de diálogo e escuta, como o Conselho Nacional da Juventude e as Conferências Nacionais.

    Neste ano, porém, a SNJ, diante da Proposta de Emenda à Constituição nº 32/2019, de autoria do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), elaborou uma nota técnica (nº 132/2020) favorável à proposta de redução da idade penal. Com esta posição, a Secretaria rompe com sua tradição histórica e democrática e com a perspectiva de direitos conquistada desde a sua criação e, inclusive, antes mesmo dela, com o pacto social construído na CF de 1988.

    As conquistas no campo das políticas de juventude passam pela aprovação de uma PEC incluindo os jovens no artigo 227 da Constituição e a sanção, em 2013, do Estatuto Nacional da Juventude pela Presidência da República, que, entre seus preceitos, assume a complementariedade ao ECA e defende de forma intransigente a doutrina de proteção integral às crianças e adolescentes. Com esse parecer, a atual titular da pasta trai um legado construído por milhares de jovens do país.

    A pauta da redução da maioridade penal não é novidade no Brasil. Desde 1993, parlamentares tentam, sem sucesso, incluir uma emenda à Constituição que busca ampliar os mecanismos punitivos e o endurecimento penal para adolescentes. Uma argumentação que não se sustenta em pesquisas e estudos qualificados, mas em matérias da grande imprensa que trazem um tom alarmista e provocam medo e sensação de insegurança na população. Essa política, agravada com a eleição de Jair Bolsonaro, se sustenta em uma agenda de ódio, de fragilização de direitos e de desmonte de políticas públicas por meio de estratégias racistas e patriarcais e da promoção do caos como tática de permanência no poder.

    Trata-se assim de uma proposta inconstitucional que fere direitos fundamentais, que viola cláusula pétrea da constituição (art. 60, § 4º CF) e que atinge pontos basilares da Convenção sobre os Direitos da Criança (1989), ratificada pelo Governo Brasileiro em 1990, e outros Tratados Internacionais de Direitos Humanos dos quais o Brasil é signatário, como o Pacto de San José da Costa Rica (1969) e a Declaração da III Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação, a Xenofobia e a Intolerância (2003). A proposta de reduzir a idade penal no Brasil já foi reconhecida como inconstitucional pela própria Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal, que, em fevereiro de 2014, rejeitou matéria que visava reduzir a imputabilidade para 16 anos.

    A redução da maioridade penal não passa de uma medida de agravamento da seletividade racial do sistema penal e de aprofundamento do genocídio, que ao longo dos anos tem sido responsável pela morte de milhares de crianças, adolescentes e jovens negros no país. Vale lembrar que a tentativa de ampliar o controle sobre corpos negros de ainda menor idade é uma prática típica de grupos autoritários, preocupados em controlar e reprimir a presença da população negra no espaço público.

    A Nota da SNJ desrespeita e ignora a proposta mais votada do espaço mais importante de participação social das juventudes, a 3ª Conferência Nacional (2015), que elegeu a proposta “Não à redução da maioridade penal, pelo cumprimento efetivo das medidas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente”, com 2.600 delegados em Brasília, em um processo que envolveu mais de 600 mil jovens no país.

    É preciso reconhecer que os direitos previstos no ECA desde 1990 e, mais recentemente, os direitos do Estatuto da Juventude, estão longe de ser uma realidade para a maioria dos jovens brasileiros. Milhões de jovens de 15 a 17 anos estão fora da escola, estão desempregados e não contam com acesso ao lazer, à cultura e ao esporte. É uma geração marcada pelas desigualdades sociais, exposta à violência e assediada por mecanismos de acesso à renda marcados pela exploração e ilegalidade. Não é à toa que a grande maioria dos jovens que cometem atos infracionais, ou que morrem por homicídio, estava fora da escola e nem chegou a concluir o ensino fundamental.

    Em que pese a tentativa dos setores conservadores de colocar os adolescentes e jovens como autores da violência, o que os dados nos mostram é que, na realidade, eles são vítimas e são os que mais morrem com a violência que assola o Brasil. Segundo o Atlas da Violência, em 2017, de 65.602 mortes por homicídios registrados no Brasil, 54,54% desse total eram jovens, que representam apenas 25% da população brasileira e, ainda, 75,5% das vítimas eram negras.

    Outro equívoco nessa discussão é de que os atos cometidos pelos adolescentes são de extrema violência, o que não é possível ser comprovado. Segundo o Conselho Nacional de Justiça, em 2015, o Brasil tinha cerca de 22.640 adolescentes privados de liberdade, acusados de terem cometido algum ato infracional. Desse total de adolescentes que estão em unidade de internação, o que corresponde aos casos mais graves, 46% foram classificados como roubo, 24% tráfico de drogas e 10% homicídios. Se considerarmos a totalidade dos atos infracionais, os crimes hediondos representam apenas 2% desses atos.

    As teorias da educação moderna argumentam em favor da maior efetividade do princípio socioeducativo em relação às medidas punitivas para tal aprendizado. As experiências internacionais que têm diminuído a criminalidade se organizam a partir de políticas de desencarceramento, reinserção do autor na sociedade e em penas em meio aberto para casos de delitos pequenos e não graves. As condições precárias dos presídios brasileiros e o domínio do crime organizado são evidências que nos apontam a ineficiência dessa alternativa para adolescentes e jovens brasileiros.

    Por fim, não custa afirmar que seguiremos defendendo a efetivação dos direitos de crianças, adolescentes e jovens. A defesa que fazemos se sustenta em medidas socioeducativas em meio aberto, voltadas a criar mecanismos que visam reinserir os jovens na sociedade com oportunidades de trabalho e desenvolvimento. Apostamos no caráter pedagógico das políticas e na construção/reconstrução de projetos de vida que visam romper com a prática do ato infracional por parte de jovens e adolescentes.

    Ângela Guimarães
    presidenta do Conselho (2012 e 2014)

    Beto Cury
    secretário nacional (2005-2010)

    Daniel Souza
    presidente do Conselho (2015-2017)

    Danilo Moreira
    presidente do Conselho (2008 e 2010)

    Davi Barros
    presidente do Conselho (2009)

    Ellen Linth
    presidenta do Conselho (2007)

    Gabriel Medina
    presidente do Conselho (2011-2012)
    secretário nacional (2015-2016)

    Jefferson Lima
    secretário nacional (2016)

    Regina Novaes
    presidenta do Conselho (2005-2006)

    Severine Macedo
    secretária nacional (2011-2014)

  • A sinodalidade é a forma de toda a Igreja ser
    – Por Dom Mario Grech

    Ampliada nacional-2020 em Cebs do Brasil

    A sinodalidade é a forma e o estilo da Igreja

    A tradução é de Moisés Sbardelotto, para o IHU, 30 Novembro 2020.

    Ao início da celebração do Consistório que criou 13 novos cardeais, em 28 de novembro, o Cardeal Mario Grech, secretário geral do Sínodo dos Bispos, dirigiu esta saudação ao Papa da parte dos novos cardeais.

    Santidade,

    Convocados ao Consistório em tempos tão graves para a humanidade inteira por causa da pandemia, queremos dirigir o nosso pensamento aos “fratelli tutti” [irmãos todos] que estão na provação. As dramáticas circunstâncias que a Igreja e o mundo estão atravessando nos desafiam a oferecer uma leitura da pandemia que ajude a todos e a cada um a também aproveitar nesta tragédia a oportunidade para “repensar os nossos estilos de vida, as nossas relações, a organização das nossas sociedades e sobretudo o sentido da nossa existência” [1].

    Posta como “sacramento, isto é, sinal e instrumento da íntima união com Deus e da unidade do gênero humano” [2], a Igreja é chamada a abrir caminhos ou, melhor, a se pôr Ela mesma, novamente, a caminho [3]. Essa é a lição do Concílio Vaticano II, no capítulo II da Lumen gentium, que recupera a ideia do Povo de Deus a caminho [4]: para o Novo Testamento a condição dos cristãos é a dos peregrinos, que vivem no mundo como estrangeiros, sabendo bem que só poderemos alcançar a plenitude no Reino de Deus [5]. Mais uma vez, no início de um novo milênio, o Espírito parece nos dizer que devemos voltar a ser “os do Caminho” (cf. At 9,2).

    Uma Igreja que caminha é uma Igreja que “caminha junto” [6]. O Povo de Deus não é uma soma de indivíduos; é o “santo povo fiel de Deus” [7]. Se ela caminha “junto”, não erra o caminho, porque, como totalidade dos batizados, exerce aquela capacidade “infalível in credendo”, o sensus fidei que o senhor tanto nos convida a escutar para discernir “aquilo que o Espírito diz à Igreja” [8]. Eram essas as solicitações que o senhor, Santidade, fez a todos por ocasião do 50º aniversário da instituição do Sínodo, quando desenhava o perfil de uma “Igreja constitutivamente sinodal” [9].

    Uma Igreja sinodal é “uma Igreja da escuta” [10]. A escuta recíproca como escuta do Espírito talvez seja a forma mais verdadeira de realizar aquele “pensamento aberto, isto é, incompleto, sempre aberto ao maius de Deus e da Verdade, sempre em desenvolvimento” [11] que o senhor, Santidade, enfatiza de bom grado como disposição do bom filósofo, do bom teólogo, evidentemente também do “bom bispo”. Não se trata, de modo algum, de relativismo; pelo contrário, capta-se aqui o próprio dinamismo da Tradição, em virtude da qual “a Igreja tende para a plenitude da verdade divina, até que nela cheguem a cumprimento as palavras de Deus” [12].

    Dentro desse dinamismo, esclarece-se o perfil da Igreja sinodal e da sinodalidade como forma e estilo da Igreja. Essa é a visão que o senhor, Santo Padre, nos propõe com força. A constituição Episcopalis communio [13] tenta implementá-lo, interpretando o Sínodo dos Bispos não mais como evento, mas como processo, no qual estão envolvidos em sinergia o Povo de Deus, o Colégio dos Bispos e o bispo de Roma, cada um segundo a sua função. Gosto de sublinhar o papel irrenunciável que o Povo de Deus desempenha nesse processo. Desse modo, o sensus fidei recupere a sua função ativa, que permite praticar a escuta como princípio de uma Igreja verdadeira e totalmente sinodal.

    A sinodalidade introduz todos os níveis da vida e da missão da Igreja numa dinâmica de circularidade fecunda: as Igrejas particulares, as províncias e regiões eclesiásticas, a Igreja universal, na qual o Colégio dos Cardeais também oferece a sua parte, estão inseridas nesse processo sinodal que manifesta “um dinamismo de comunhão que inspira todas as decisões eclesiais” [14].

    Essa é a base da tarefa que, juntos, somos chamados a desempenhar e a cujo serviço se coloca a Secretaria do Sínodo. Ela pode colaborar para facilitar as passagens entre os níveis de exercício da sinodalidade. A sua primeira contribuição é precisamente a da escuta: eu já escrevi a todos os bispos, oferecendo a nossa disponibilidade, e muitos, de todas as partes da terra, me confirmaram a importância da escuta recíproca. Mas creio e desejo que a Secretaria possa fazer mais, por exemplo, apoiando os bispos e as Conferências Episcopais no amadurecimento de um estilo sinodal, sem interferir, mas acompanhando os processos em curso nos diversos níveis da vida eclesial.

    Essa pode ser a modalidade com que a Secretaria do Sínodo participa do dinamismo da “Igreja em saída” [15], em um mundo que, nas circunstâncias dramáticas que estamos atravessando, precisa ainda mais que a Igreja seja verdadeiramente “sacramento universal de salvação” (LG 48).

    Quem nos sustenta é a esperança, dom do Espírito Santo para os tempos difíceis. Charles Péguy, em “O pórtico do mistério da segunda virtude”, a imaginava como “uma menina de nada”, a menor das irmãs, entre a fé, comparada a uma esposa, e a caridade, vista como uma mãe. E concluía: “O povo cristão só presta atenção nas duas irmãs mais velhas, a primeira e a última (…). Cegos que são, não conseguem ver que, em vez disso, é a do meio que arrasta as duas irmãs mais velhas” [16].

    “Não deixemos que nos roubem a esperança!” [17]. Que Maria, a Stella maris, que nós, malteses, veneramos sob o título de Nossa Senhora de Ta ‘Pinu, nos infunda essa esperança.

    Ao senhor, Santo Padre, que quis nos escolher para um serviço mais direto à Igreja, pedimos que nos abençoe.

     

    Notas:

    1. Francisco, encíclica Fratelii tutti, n. 33
    2. Concílio Vaticano II, constituição dogmática Lumen Gentium, n. 1
    3. Antonio Machado, em um poema famoso, escreve: “Caminante, son tus huellas/ el camino, y nada más;/caminante, no hay camino:/ se hace camino al andar./ Al andar se hace el camino/y al volver la vista atrás/se ve la senda que nunca/ se ha de volver a pisar./ Caminante, no hay camino/ sino estelas en el mar” (coleção Campos de Castilla, in “Proverbios y cantares”, XXIX, 1912). O Salmo 77, fazendo memória do relato do Êxodo, diz: “[Ó Deus] Abriste um caminho entre as águas, uma senda nas águas torrenciais, sem deixar rastro dos teus passos. Guiaste o teu povo como a um rebanho, pela mão de Moisés e de Aarão” (Sl 77,20-21).
    4. O apóstolo Pedro, dirigindo-se aos cristãos das primeiras comunidades como “peregrinos da diáspora” (1Pd 1,1), que residem por um curto período de tempo em terra estrangeira, convidava-os a “se comportar com temor durante este tempo da sua peregrinação” (1Pd 1,17).
    5. Em uma releitura da condição do homem contemporâneo, Duccio Demetrio diz que hoje é preciso “saber existir na mutabilidade, na imprevisibilidade do percurso, até mesmo na perda da meta no meio do caminho. Em uma exaustiva transformação dos caminhos, do solo em que confiamos, dos guias aos quais havíamos nos entregado. Caminhar sem descanso é uma disposição contínua para aprender”: D. Demetrio, “Metafore del cammino”, in “Filosofia del camminare”, Milão, 2005.
    6. O convite do Papa Francisco, no discurso por ocasião do 50º aniversário da constituição do Sínodo dos Bispos, foi o de “caminhar juntos”: “O mundo em que vivemos e ao qual somos chamados a amar e a servir também nas suas contradições exige da Igreja a potencialização das sinergias em todos os âmbitos da sua missão. Precisamente o caminho da sinodalidade é o caminho que Deus espera da Igreja do terceiro milênio”.
    7. Cf. especialmente a carta do Papa Francisco ao cardeal Ouellet, presidente da Pontifícia Comissão para a América Latina (19 de março de 2016).
    8. Para aquilo que o Papa Francisco entende por sensus fidei, cf. especialmente EG 119.
    9. Francisco, discurso por ocasião do 50º aniversário da instituição do Sínodo dos Bispos (17 de outubro de 2015).
    10. Francisco, discurso no 50º aniversário da instituição do Sínodo.
    11. “O jesuíta deve ser uma pessoa de pensamento incompleto, de pensamento aberto. Houve épocas na Companhia nas quais se viveu um pensamento fechado, rígido, mais instrutivo-ascético do que místico. Não, o jesuíta pensa sempre, constantemente olhando para o horizonte ao qual deve ir tendo Cristo no centro. Essa é a sua verdadeira força. E isso leva a Companhia a estar em busca, a ser criativa, generosa”: entrevista em La Civiltà Cattolica, 164 [2013] vol. 3, 3918, 455. “O bom teólogo e filósofo tem um pensamento aberto, isto é, incompleto, sempre aberto ao maius de Deus e da verdade, sempre em desenvolvimento” [constituição apostólica Veritatis gaudium, 3]
    12. Concílio Vaticano II, constituição dogmática Dei Verbum, n. 8
    13. Francisco, constituição Episcopalis communio sobre o Sínodo dos Bispos (15 de setembro de 2028).
    14. Francisco, discurso no 50º aniversário da instituição do Sínodo.
    15. Cf. Francisco, exortação apostólica Evangelii gaudium, n. 24.
    16. Charles Péguy, “Os mistérios”. “O pórtico da segunda virtude”, Milão, 1978, p. 168.
    17. Francisco, exortação apostólica Evangelii gaudium, n. 86
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