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Movimento Fé e Política de Três Rios realiza Fórum sobre Religião, Política e Direitos Humanos

Por padre Medoro

 

Religião, Política e Direitos Humanos

Por padre Medoro – Publicado em Entre-Rios Jornal, 04 de dezembro de 2019

Nos dias 29 e 30 de novembro, aconteceu no auditório da UFRRJ de Três Rios o Fórum Religião, Política e Direitos Humanos. Esse evento foi organizado pelo Movimento Fé e Política de Três Rios em parceria com o Núcleo de Práticas Jurídica da UFRRJ/ITR. Foram 4 mesas de debates muito ricos, em que aprofundamos diversas questões relacionadas ao tema do Fórum, com especialistas das áreas discutidas.

Na primeira mesa, da qual participei como convidado para fazer a abertura, junto com o professor Rullian Emmerick, coordenador do Núcleo de Práticas Jurídicas, tivemos o tema Políticas Públicas e Políticas de Direitos Humanos e os convidados dessa mesa foram o ex-Ministro chefe da Secretaria -Geral da Presidência da República Gilberto Carvalho, que com sua simplicidade, foi nos apresentando, criticamente, as dificuldades em desenvolver Políticas Públicas voltadas para a construção de direitos para uma população historicamente excluída de todo processo de desenvolvimento. A grande novidade na última década foi a inclusão do pobre no orçamento do país, política que vê o combate à miséria e à pobreza não como custo, mas como investimento. Infelizmente, hoje nós temos os interesses do capital destruindo todos os avanços sociais conquistados. E outro convidado foi o Professor Cunca Bocayuva do Núcleo de Estudo de Políticas Públicas em Direitos Humanos da UFRJ, que com uma análise instigante, nos levou a pensar as contradições existentes nas diversas linguagens políticas, religiosas, midiáticas que envolvem hoje toda essa problemática do não direito. Ou seja, há um processo de desconstrução em que o mecanismo utilizado é o MEDO, por isso há necessidade de se organizar na sociedade uma resistência contra essa lógica perversa que destrói as possibilidades de vida de uma grande maioria da nossa sociedade.

Na segunda mesa, o tema discutido foi Democracia e Direitos Humanos, e o convidado foi o professor Waldeck Carneiro da Pós Graduação da Faculdade de Educação da UFF e Deputado Estadual, que de uma forma bem aprofundada e didática, nos introduziu no debate da atual crise democrática demonstrando que todo o processo de perdas de direitos sociais está diretamente ligada aos interesses do capital internacional e que hoje estamos, cada vez mais, reféns desses interesses, e a perda da soberania é uma marca da atual gestão do país. Ele apresenta como exemplo o corte de recursos para as universidades e os órgãos de pesquisa e tecnologia uma forma de regresso ao colonialismo e a dependência as grandes potencias. Isso aprofunda a crise social e econômica em que nos encontramos, aprofundando as mazelas sociais. Foi um rico debate com grande participação da plateia. Uma mesa muito bem conduzida pela professora Marcela Siqueira Miguens da UFRRJ/ITR, que com seus comentários nos levou a pensar como as perdas de direitos está atingindo a essência da democracia que é o Estado de Direitos.

A terceira mesa foi relato de vida e de pesquisa frente a duas realidades em que se encontra o que nós chamamos de minorias sociológicas, as populações afrodescendentes e as indígenas. Os debatedores foram os professores Babalawô Ivanir dos Santos da UFRJ e Heiberle Horácio coordenador do curso de Ciências da Religião da Universidade Montes Claros – MG, que aprofundaram o tema Direitos Humanos, Religião e Minorias. Ivanir dos Santos demonstra que a intolerância contra a população negra não está presente só nas relações, mas também, de forma enfática, na construção do pensamento moderno e isso, sem dúvida nenhuma, fortalece essa realidade de intolerância contra as religiões de matrizes africanas. Por isso, a necessidade de se mobilizar contra qualquer forma de preconceito passa por articulações entre as próprias religiões. Dentro desse contexto, ele exemplifica a Caminhada em defesa da Liberdade Religiosa, em que é um dos organizadores, e que no Rio acontece desde 2008, como uma forma de resistência contra a toda e qualquer forma de intolerância religiosa. O professor Heiberle, através do seu relato das suas pesquisas e, principalmente, das suas relações com povos indígenas (principalmente com o povo Xakriabá, no município de São João das Missões – Norte de Minas e povos indígenas da região Amazônica) nos faz pensar sobre algumas questões que são fundamentais. Uma delas seria o local da fala. Quando inicia a sua explanação, deixa claro isso, mesmo como pesquisador, que “ele não fala pelos povos indígenas, mas fala com os povos indígenas”. É se situar na luta e na vida desses povos e não vê esses povos como um objeto utilitários das suas pesquisas. Uma outra questão é que a Religião mata, ou seja, quando as religiões se adentram nas comunidades indígenas elas, muitas vezes, eliminam ritos, símbolos e vivências desses povos, fazendo com que percam referenciais das suas culturas; e por último, podemos dizer que continuamos vendo a realidade dos povos indígenas dentro de uma perspectiva etnocêntrica, a partir de nós, das nossas realidades, ou seja de um olhar de fora, não se abrindo para ouvir a fala desses povos por eles mesmos, isso certamente ajuda na continuidade desse processo de intolerância e preconceito.

E por fim, a última mesa de debates, o Tema foi: Fé e Política: Alienação ou Transformação. Para essa mesa, contamos com a presença do professor (PUC- RIO), Teólogo e Assessor Nacional das Cebs Celso Carias e com o professor da Escola do Legislativo da ALERJ e da Pós graduação do Direito da PUC Leonardo Ribas. Celso nos leva a pensar o tema, a partir de duas referências para a vida cristã. A primeira é a vida dos primeiros cristãos, que mais que ações políticas tiveram experiências que modificavam as formas de viver e de se relacionar. Opunham-se ao poder Romano, a partir da solidariedade com os mais excluídos. E a segunda, e mais importante é pensar a vida do Jesus histórico, pensar o que significa o seguimento de Jesus na realidade dos nossos dias. E o Leonardo nos apresenta a ideia da ruptura democrática está levando cada vez mais para a desumanização da sociedade e que a crise da democracia é também uma crise humana. E que hoje, mais do que uma questão ideológica faz-se necessário resgatar essa humanidade nessa sociedade cada vez mais desumana.
Além dos debates temáticos esse fórum propiciou uma aproximação da universidade com a sociedade, dividindo experiências e saberes, fazendo-nos cada vez mais comprometidos com a luta pelos Direitos Humanos, dentro de uma perspectiva que o Papa Francisco nos traz:

Cada um é chamado a colaborar com coragem e determinação, na especificidade de sua função, em prol do respeito dos direitos fundamentais de cada pessoa, especialmente as “invisíveis”: aquelas que têm fome e sede, que estão nuas, doentes, estrangeiras ou detidas, que vivem às margens da sociedade ou são descartadas.” Papa Francisco.

Medoro, irmão menor-padre pecador.

 

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